Foi aos 16 anos que Paula começou a perder a audição. Foram muitas otites, zumbidos no ouvido, erros de diagnóstico, até ela descobrir que já estava com surdez neurossensorial bilateral de caráter severo e progressivo.
O período de aceitação da deficiência foi doloroso e solitário, e fez com que Paula se fechasse num universo de poucos amigos íntimos e de familiares. Nesse período foi necessário recorrer à leitura labial como forma de comunicação.
O primeiro aparelho aditivo veio em 1997. Em 2013, ela fez o primeiro implante coclear. Em 2016, o segundo implante. E desde então graças a tecnologia ela voltou a ouvir.
Paula é formada em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), foi servidora pública da Receita Estadual do Rio Grande do Sul durante 13 anos. Em 2016, teve uma breve passagem pelo time de comunicação da L’Óreal DCA. Desde 2015, é empresária do ramo digital, palestrante e consultora, e reside no Rio de Janeiro.
O site Crônicas da Surdez nasceu em 2010, e em 2018, bateu a marca de 1.200.000 acessos orgânicos. “Comecei porque precisava de força para sair do armário da surdez e, assim, ajudar outras pessoas a saírem também. Essa rede de informação, afeto e apoio deu tão certo que, três anos depois, eu estava fazendo um Implante Coclear e voltando a ouvir!”, comemora.
Suas histórias geraram dois livros: Crônicas da Surdez, de 2013, que foi finalista do Prêmio Biblioteca Nacional; e Novas Crônicas da Surdez: Epifanias do Implante Coclear, de 2015, já traduzido para o inglês.
Em 2017, fez o TEDx Talk “Surdos Que Ouvem”: foi aí que nasceu a expressão que deu nome ao projeto realizado junto ao Facebook.
Seu grupo fechado no Facebook possui 13.200 membros e alto engajamento. Apenas pessoas com deficiência auditiva, seus pais e/ou cônjuges podem solicitar a entrada. São milhares de comentários em cada um dos posts toda semana, mostrando a força dessa rede de afeto e apoio que vem sendo construída há nove anos.
Em 2019, além de liderar o Projeto Surdos Que Ouvem, Paula deu palestras na Europa, fez um curso de extensão na Universidade Columbia em NY, prestou consultoria para grandes empresas da indústria da audição, e subiu no palco em diversos eventos do Facebook, no Brasil e nos EUA, para falar do seu trabalho como líder de comunidade.
Ela também é protagonista de uma inspiradora história de amor: conheceu o marido, o otorrinolaringologista Luciano Moreira, pelo Facebook. “No dia da ativação do meu primeiro implante coclear, o Luciano, que eu não conhecia, me enviou uma mensagem dizendo que tinha lido meu livro, que era meu fã, que meus escritos estavam ajudando os pacientes dele, e desejando boa sorte na ativação. Respondi, e começamos a trocar mensagens…”, entrega. Depois disso, os dois se casaram em Porto Alegre, tiveram um filho, e não se largaram mais: “Ele é meu grande parceiro, minha alma gêmea e tem a mesma paixão que eu pela causa dos surdos que ouvem.”
Entre os objetivos de Paula estão mostrar a diversidade de tipos de surdez, mostrar as possibilidades que a tecnologia oferece para as pessoas com deficiência auditiva, e acolher surdos e seus familiares. Metas que ganharam a força necessária para virar um grande projeto de impacto positivo – o Surdos Que Ouvem – com a escolha de Paula, ela própria uma surda que ouve, como residente do Facebook Community Leadership Program.
Desinformação, preconceito, falta de acesso a um diagnóstico, e altos preços dos dispositivos são alguns dos motivos para que 7 em cada 10 pessoas com deficiência auditiva que podem se beneficiar da tecnologia para ouvir melhor ou voltar a ouvir não se beneficiem. “O meu trabalho no Crônicas da Surdez, e agora no projeto Surdos Que Ouvem, com o FCLP, são desenvolvidos para enfrentar boa parte dessas barreiras. Além disso, é importante dizer que existe alguém com deficiência auditiva na maioria das famílias – seja o idoso que vem perdendo a audição, um adulto, um adolescente, ou uma criança. Por isso, nós queremos atingir todas as pessoas, para mostrar o quão comum é a perda auditiva, quais os prejuízos que ela causa, e as opções de tratamento capazes de minimizar isso.”
Projeto pode aproximar a comunidade surda com iniciativas 100% acessíveis
Paula Pfeifer criou o Surdos Que Ouvem para promover acesso à tecnologia e acolhimento. “Com a campanha de vídeos, estamos mostrando as possibilidades que a tecnologia oferece para as pessoas com deficiência auditiva – seja por meio de aparelhos auditivos, de implantes cocleares, ou de ferramentas de acessibilidade. Com os eventos Conexões Sonoras, estamos levando informação médica, fonoaudiológica e de acessibilidade, bem como aumentando o impacto offline que o grupo Crônicas da Surdez causa na vida dos seus membros, seja inspirando, com o compartilhamento de experiências, seja oferecendo uma rede de afeto e suporte. Seguiremos acolhendo as pessoas com deficiência auditiva e seus familiares que queiram fazer parte do nosso grupo Crônicas da Surdez no Facebook, como sempre fizemos”, ressalta.
Como informação é poder, Paula tem o grande desafio de informar sem excluir ninguém. “Minha intenção sempre foi – e neste projeto continua sendo – mostrar justamente a diversidade que existe na surdez. O senso comum sempre liga o termo surdez ao uso da língua de sinais. Qualquer um pode fazer uma experiência e perguntar aos seus amigos e familiares como uma pessoa surda faz para se comunicar, eu garanto que 90% vão responder que é através da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Entretanto, eu sou surda e não é assim que eu me comunico, nem os 12 mil membros do nosso grupo, nem os milhões de pessoas que usam aparelho auditivo e implante coclear no Brasil e no mundo”.
Ela esclarece que Libras é uma língua importantíssima para aqueles que dependem dela para se comunicar, e a acessibilidade através dela é uma ferramenta de suma importância para muitas pessoas, mas inclusão é palavra de ordem: “O que nós queremos mostrar é que a acessibilidade de que os Surdos Que Ouvem precisamos é diferente. Minha preocupação é com todos os surdos, sem exceção, e nossas iniciativas serão 100% acessíveis, com legendas, aro magnético, e intérprete de língua de sinais”. Finaliza.
Surdos que Ouvem
Surdos Que Ouvem (www.surdosqueouvem.com) é um projeto com viés social colaborativo e de inclusão. O objetivo é ampliar o impacto online do Crônicas da Surdez e criar um consistente legado offline a partir da desmistificação da surdez e da propagação de informação sobre reabilitação auditiva.
O projeto reúne quatro iniciativas:
- Campanha de vídeo com 12 personagens inspiradores que revelam o processo a partir do diagnóstico da deficiência auditiva, seus desafios e o quanto o uso de tecnologias auditivas transforma vidas.
- Conexões Sonoras: eventos 100% acessíveis a surdos, com legendas, aro magnético e intérprete de Libras. O CS promove acesso à informação de alta qualidade, através de Talk-show com médicos e fonoaudiólogos especializados em surdez, palestra de Paula Pfeifer e depoimentos de Surdos Que Ouvem.
- Curso online para pais de crianças surdas: como o engajamento da família na estimulação da criança com deficiência auditiva é primordial, mas nem todas as famílias estão perto de cidades grandes, nem têm acesso a especialistas, o curso é direcionado aos pais, com aulas ministradas por profissionais renomados e com linguagem acessível.
- Engajamento da comunidade e treinamento de liderança: para ampliar ainda mais o alcance desta causa, será oferecido apoio financeiro para que membros do grupo Crônicas da Surdez criem e executem até 20 projetos em um formato de Mini Conexões Sonoras, levando o #surdosqueouvem aos quatro cantos do Brasil. Aqueles que mais se destacarem receberão um treinamento de liderança ministrado por Paula Pfeifer, bem como prêmios de nossos parceiros.
- Fonte https://deficienciaemfoco860798267.wordpress.com/2020/03/10/quando-a-tecnologia-transforma-realidades-paula-pfeifer-e-a-deficiencia-auditiva/
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