Fatores como inflação, alta do dólar e as próprias dificuldades financeiras causadas pela pandemia farão desaparecer no segundo semestre as versões de veículos específicas para clientes PCD (pessoas com deficiência).
Devido ao aumento nos custos de produção, as montadoras não vão mais conseguir oferecer configurações especiais, adaptadas com a retirada de alguns itens de série de forma a custarem menos do que R$ 70 mil - este é o teto para dar direito às isenções totais de ICMS, IPI e IPVA na aquisição de um carro zero-quilômetro a esse público.
A informação é da Anfavea, a associação que representa as montadoras, e da Abridef (Associação Brasileira da Indústria, Comércio e Serviços de Tecnologia Assistiva para Pessoas com Deficiência).
As duas entidades conversaram com UOL Carros e defendem a elevação no preço máximo para a concessão dos benefícios fiscais - estabelecido há 11 anos pelo Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), órgão vinculado ao Ministério da Economia. Desde então o valor nunca foi reajustado.
Na avaliação da Anfavea e da Abridef, esse seria o caminho para que pessoas com deficiência possam continuar comprando carros maiores, mais adequados para atender as necessidades de cadeirantes, por exemplo, mantendo as isenções previstas pela legislação.
'Teto seria de R$ 110 mil considerando só a inflação'
Hoje, a grande maioria das versões PCD é formada por SUVs compactos, cujas configurações automáticas convencionais de entrada já têm preço cheio bem acima de R$ 70 mil.
Com o fim da oferta, restarão apenas modelos como hatches e sedãs pequenos, que já oferecem opções abaixo do teto sem a necessidade de criação de um pacote exclusivo de equipamentos de série para deficientes.
"Seguramos ao máximo as versões PCD no mercado, mas não temos mais como mantê-las. Vão desaparecer mesmo, a menos que o limite de R$ 70 mil seja revisto", afirma Ricardo Martins, vice-presidente da Anfavea.
O executivo destaca que desde o ano passado as montadoras mantêm conversas com o Confaz em conjunto com a própria Abridef e a Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego) na tentativa de aumentar o teto atual.
Nas duas próximas semanas, diz, a associação vai intensificar conversas com governadores e secretários estaduais da Fazenda, integrantes do conselho federal, para sensibilizá-los a respeito da demanda.
"Se fosse considerada apenas a inflação desde 2009, quando o teto passou a vigorar, o limite hoje seria de R$ 110 mil, aproximadamente", estima Martins.
Ele destaca que o cálculo não leva em conta a expressiva alta no dólar verificada durante os últimos meses, que impacta diretamente os custos de produção, sobretudo de carros equipados com transmissão automática - presente em 100% das configurações PCD.
"Hoje algo entre 30% e 40% do custo de um automóvel correspondem a componentes importados, cotados em dólar. Boa parte da eletrônica utilizada nos câmbios automáticos também é trazida de fora. Especialmente os SUVs pequenos incorporaram itens de segurança nos últimos anos, algo que também fez os preços subirem".
Versões PCD começam a sumir
Apesar de representarem uma margem de venda unitária cada vez menor, as versões criadas para pessoas com deficiência têm uma importância elevada para as montadoras em termos de volume.
Para se ter ideia, a configuração PCD representou mais de 50% dos licenciamentos de três dos quatro SUVs mais vendidos em junho. No caso do Hyundai Creta, esse percentual passou de 80%.
Algumas marcas já estão retirando itens de série dos seus utilitários esportivos para deficientes e pelo menos uma montadora deixou de oferecer opção específica: de acordo com Jorge Moraes, colunista de UOL Carros, a Citroën suspendeu a oferta do C4 Cactus PCD, que não tem data para voltar.
A Volkswagen, por sua vez, não tem previsão de lançar versão do Nivus para pessoas com deficiência e preferiu dar desconto sobre os preços de tabela, superiores a R$ 70 mil, somado à isenção apenas do IPI. A marca francesa está adotando estratégia semelhante.
As encomendas de Chevrolet Tracker e Spin PCD também estão suspensas por tempo indeterminado desde maio.
"Defendemos o reajuste para dar acesso aos clientes PCD a veículos que atendam suas necessidades de mobilidade em termos de segurança, espaço e itens de conforto. O direito à mobilidade é previsto na Constituição e deve ser respeitado".
Fim de linha até setembro
De acordo com Rodrigo Rosso, presidente da Abridef, todas as versões para pessoas com deficiência sairão de linha até setembro.
"Nem o Nissan Kicks vai aguentar ficar com preço abaixo de R$ 70 mil. Levantamos essa informação com as próprias montadoras. Além disso, a isenção do ICMS, concedida exclusivamente para modelos com preço abaixo do teto, só vale até o fim deste ano".
"A partir do segundo semestre, as fábricas não vão mais suportar segurar os preços e as pessoas ficarão sem opção de modelos para aquisição com isenção", complementa Rosso.
O presidente da Abridef informa que já encaminhou ofício solicitando uma "imediata reavaliação" dos valores a Paulo Guedes, ministro da Economia e presidente do Confaz.
Segundo Rosso, o Confaz tem reunião para tratar do tema no dia 23 de julho e qualquer decisão requer aprovação unânime dos secretários estaduais da Fazenda.
A Abridef defende que o valor seja elevado para pelo menos R$ 90 mil.
"A primeira alternativa seria realizar o reajuste, que poderia ser praticado por meio dos índices oficiais, como INPC ou IGP-M. A segunda opção seria determinar que pessoas com deficiência adquiram qualquer veículo com as isenções, desde que a potência seja de até 127 hp [128,7 cv], independentemente do valor de mercado. Era assim antes de 2009", defende.
A Anfavea, por outro lado, é contrária à retomada do critério de potência por considerar que ele reduziria bastante a quantidade de opções disponíveis.
A reportagem também procurou o Confaz e recebeu a seguinte resposta:
"Neste momento, o Ministério da Economia não está comentando o assunto".
Fonte https://www.uol.com.br/carros/noticias/redacao/2020/07/17/por-que-versoes-pcd-de-carros-estao-fadadas-a-desaparecer-ainda-neste-ano.htm
Postado por Antônio Brito
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