Neste ano, apenas 21% das crianças de 0 a 5 anos foram vacinadas contra a poliomielite no estado de São Paulo. A meta da Secretaria Estadual de Saúde é vacinar 95% até o dia 30 de outubro, o que representa 2,1 milhões de crianças. Até agora, apenas 460 mil foram aos postos se imunizar.
A poliomielite, chamada de paralisia infantil, não registra mais casos no país graças à vacina. Em agosto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que apenas dois países no mundo ainda registravam casos da doença, Paquistão e Afeganistão. Mas o risco da doença voltar ao país ainda existe.
Em 2019, a meta também não foi atingida no estado. "A gente tem observado nos últimos anos que a adesão às vacinas tem caído um pouco. A vacina é um bem público. Com a pandemia e a queda nas coberturas vacinais, estamos sim com a preocupação do retorno de outras doenças, cujas vacinas têm uma excelente proteção", disse Helena Sato, coordenadora do Programa Estadual de Imunização.
A ajudante geral Viviane dos Santos Caetano já levou seu filho Enzo, de 2 anos, para se vacinar. "Acho muito importante, ter a carteirinha de vacinação em dia e levar pra tomar em todas as campanhas".
Nos postos de saúde também estão disponíveis outras 13 vacinas como a do HPV, a pentavalente e a BCG, que protege da tuberculose. Em nenhuma delas se atingiu a meta de vacinação.
Vacinas disponíveis no Sistema Único de Saúde — Foto: Reprodução/TV Globo.
Em tempos de pandemia, a foto do formando com o diploma na mão é tirada na sala de casa. Se a cena parece “comum” nos dias de hoje, o retrato tirado pelo estudante Iury Moraes, este semestre, mostra o contrário.
Primeiro estudante surdocego a se formar na Universidade de Brasília (UnB), Iury ultrapassou inúmeros desafios para exibir, orgulhoso, o “canudo” na mão.
O jovem de 26 anos nasceu com catarata e surdez profunda congênita e ingressou no curso de Letras, em 2016. Ele também foi o primeiro estudante surdocego a entrar na instituição.
Com ajuda da mãe, Elemregina Moraes, Iury conta que sempre estudou em escolas públicas em Brasília, com colegas com e sem deficiência, surdos e cegos ouvintes.
Para ele, ter pessoas com deficiência estudando em escolas regulares força as instituições a promoverem políticas de acessibilidade e inclusão.
A diretora do Instituto de Letras da UnB, Rosana Rigota, relata que os desafios foram muitos – para ele e para a universidade.
Iury se formou em licenciatura em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e português como segunda língua. Cerca de 30 surdos, três deles surdocegos, estudam atualmente no Instituto de Letras da UnB.
Segundo a presidente do Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial, Cláudia Sofia Pereira, há pelo menos 7 mil estudantes com essa deficiência no Brasil.
Iury não pretende parar. Dar aulas, fazer mestrado e doutorado estão nos planos do jovem. Perguntado se, diante das dificuldades, pensou alguma vez em desistir, ele foi categórico: “nunca”.
Iury Moraes é o primeiro estudante surdo e cego a se formar num curso de graduação na Universidade de Brasília . – Arquivo pessoal Fonte https://revistareacao.com.br/primeiro-estudante-surdocego-se-forma-na-unb/POSTADO POR ANTÔNIO BRITO
Veja as universidades públicas e privadas com as maiores taxas de representatividade de alunos com deficiência do país
Dentro de um universo de 8,45 milhões de estudantes em faculdades, apenas 43.633 pessoas com deficiência estão inseridas no Ensino Superior brasileiro. Esse número representa somente 0,5% do total de alunos do país.
Os dados são do Censo da Educação Superior de 2018, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) e consultados pelo Quero Bolsa*, plataforma de inclusão de estudantes no Ensino Superior.
Em 2010, a taxa era 0,3% (19.818 alunos). Apesar do número de estudantes com deficiência crescer em mais de 120% na década, a taxa de representatividade continua bem inferior à parcela da população brasileira com esse perfil.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 6,2% dos brasileiros têm algum tipo de deficiência, seja ela auditiva, física, intelectual ou visual. O levantamento foi feito em 2015 pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do IBGE com o Ministério da Saúde.
Segundo o IBGE, a deficiência que mais ocorre entre os brasileiros é a visual, que atinge 3,6% da população. Mas entre os universitários, a mais representativa é a deficiência física. Entre os estudantes com deficiência, 35,9% são pessoas com deficiência física.
Universidades com maior representatividade de pessoas com deficiência do Brasil
Apenas 51 universidades brasileiras que possuem mais de 5 mil alunos matriculados possuem 1% ou mais de estudantes com alguma deficiência: são 36 instituições públicas e 15 privadas.
A instituição que mais se aproxima à taxa nacional é o Instituto Federal da Paraíba (IFPB), onde 4,1% dos seus mais de 10 mil estudantes têm alguma deficiência. Em seguida, aparece a Universidade Federal do Acre (Ufac), com 3,9% de representatividade.
Em terceiro e quarto na lista, aparecem a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e a Universidade Federal de Alagoas (Ufal). com 2,9% e 2,6% de estudantes com deficiência respectivamente. Fecha as cinco primeiras a Universidade Estadual de Maringá (UEM), com a taxa de 2,5%.
Veja a lista das universidades públicas com maior representatividade de alunos com deficiência:
As universidades privadas com maior taxa de alunos com deficiência:
A primeira universidade privada a aparecer nessa lista é o Centro Universitário Hermínio Ometto (Uniararas), onde 2% do seu quadro de estudantes é composto por pessoas com deficiência (260 alunos). Em seguida, o Centro Universitário Maurício de Nassau (Uninassau) de João Pessoa, na Paraíba, é destaque, com 1,7% de alunos com deficiência.
O Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e o Centro Universitário Fundação Assis Gurgacz (FAG) aparecem em terceiro e quarto, com representatividade de 1,6% e 1,3%, respectivamente. Fecha o top 5 o Centro Universitário FIAM FAAM. Veja a lista abaixo:
- Alunos com algum tipo de deficiência declarados no Censo de 2018. - A Revista Quero incluiu as universidades com mais de 5.000 alunos matriculados, segundo o MEC. - Foram incluídos apenas os estudantes matriculados, ou seja, com o status "Cursando" e "Formado" apresentado no Censo de 2018.
Na universidade, Douglas fez parte do seleto número de pessoas com deficiência (PcD) que chegam ao Ensino Superior. Segundo o Censo Superior da Educação 2018, os estudantes com deficiência representam apenas 0,52% do total de matriculados em cursos de graduação.
Mesmo com toda falta de acessibilidade no ambiente universitário, Douglas continuou seus estudos e ingressou na pós-graduação. A professora que lhe perguntou o que ele estava fazendo na universidade foi convidada para sua banca de mestrado. “Para mostrar para ela o que eu estava fazendo ali”, conta.
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Docentes com deficiência em números
Chegar ao mestrado, doutorado e à docência do Ensino Superior é um privilégio para poucos. Quando Douglas voltou à universidade, ele entrou num universo ainda mais exclusivo: o de professores universitários com deficiência.
O número de docentes com deficiência corresponde apenas a 0,44% do total de professores do Ensino Superior, em cursos de graduação. Ou seja, dos quase 400 mil docentes, somente 1.731 são PcD, de acordo com o Censo.
Entre os professores universitários com deficiência, a maioria tem deficiência física (49,34%), limitações relacionadas aos aspectos físico e motor. Já o nível de formação mais comum entre eles é o mestrado (38,13%), seguidos pelo doutorado (34,60%) e a especialização (25,88%).
A baixa representatividade de docentes com deficiência no Ensino Superior reflete exclusão dos estudantes com deficiência desde o Ensino Básico. Isso porque são recentes as legislações e políticas públicas voltadas à inclusão das PcD na educação.
Reprodução/Luís Fortes/MEC
Um dos documentos importantes nesse sentido, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, foi criado apenas em 2008. O Estatuto da Pessoa com Deficiência, também conhecido como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, foi conquistado em 2015. Já a reserva de vagas nas instituições federais só ocorreu em 2016, quando as PcD foram incluídas na Lei de Cotas de 2012.
O professor do Instituto Federal Fluminense (IFF), Décio Nascimento Guimarães, considera que essas leis irão surtir efeito no futuro. Embora ele acredite que o atual número de professores com deficiência no Ensino Superior poderia ser mais expressivo.
“Eu sou de uma primeira geração de PcD desse século que passaram no Ensino Superior e galgaram o stricto sensu. Eu acredito que nas próximas décadas, o número de doutores com deficiência será ainda maior, [porque] tem um intervalo [da Educação Básica ao doutorado], estamos falando de 2030, a geração que virá”, afirma.
Falta de acessibilidade
Para as pessoas com deficiência que desejam ingressar na universidade, muitas vezes, a primeira barreira é o vestibular. Além de todo conhecimento básico necessário para prestar as provas, alguns tipos de deficiência exigem adaptações nos processos seletivos que nem sempre são atendidos.
Da sua época de vestibular, o professor Décio, cego desde os 16 anos, relembra a dificuldade dos ledores de fazer a audiodescrição das imagens: ”As questões de química, física e matemática tinham que ser solucionadas de uma maneira quase intuitiva”.
Já dentro do ambiente acadêmico, o entrave que impacta diretamente na permanência das PcD na universidade é a falta de acessibilidade, seja arquitetônica, comunicacional, metodológica, instrumental e, principalmente, atitudinal - que envolve a modificação de espaços e compra de equipamentos. O professor Douglas é categórico: “O problema não está na pessoa mas sim no sistema que não oferece condição”.
“Na banca de um colega, disseram ele podia ter aumentado a literatura. Ele disse que gostaria, se o portal da CAPES desse mais oportunidades para ele acessar as teses e dissertações. Outra colega desenvolveu uma hérnia de disco e uma tendinite pelas condições de estudo. A uma aluna minha é oferecido um material que não está acessível a condição dela, então como que ela participa da leitura junto com os colegas?”, ele exemplifica.
Douglas Christian é professor universitário com deficiência por baixa visão (Foto: arquivo pessoal)
Durante sua graduação em Jornalismo na Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp), a jornalista especializada em Linguagem, Cultura e Mídia Ana Raquel Périco Mangili, que tem deficiência auditiva de grau severo bilateral, conseguiu o auxílio de uma monitora-cuidadora durante o período das aulas, pois ela também tem uma deficiência física, chamada Distonia, que restringe os movimentos de ambos os braços e pescoço.
Além disso, Ana Raquel recebeu o empréstimo de um notebook, para as anotações das aulas e realização das provas com autonomia, e o acesso aos conteúdos audiovisuais do curso por meio da legendagem feita por um grupo de estudos sobre acessibilidade da própria Unesp.
Ana Raquel durante seu intercâmbio universitário na Universidade de Salamanca, na Espanha (Foto: Arquivo pessoal)
Entretanto, quando Ana Raquel decidiu entrar na pós-graduação, não foi lhe oferecido a mesma acessibilidade. Pela falta de verba, o departamento de pós graduação não pôde pagar uma monitora-cuidadora. “Por um ano e meio meus pais tiveram que se revezar para me acompanhar nas aulas da especialização”, relata.
Capacitismo
Aliado à falta de acessibilidade, outro obstáculo para as PcD na universidade é o capacitismo, termo que expressa as atitudes de preconceito, discriminação e opressão contra pessoas com qualquer tipo de deficiência.
“O capacitismo é capaz de desmotivar muitas pessoas com deficiência a buscarem seus direitos e ocuparem diferentes espaços públicos, porque a sociedade, nas entrelinhas, nos olhares e nos cochichos, está sempre julgando o indivíduo como incapaz e desmerecedor de estar ali, só porque ele não está dentro de um padrão pré-estipulado e também porque os espaços públicos não costumam contar com adaptações mínimas para os variados tipos de deficiência”, explica Ana Raquel.
A discriminação também foi sentida na pele por Michelle Murta, primeira professora surda efetivada da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela recorda que, durante seu mestrado, um professor de fonologia, diante de toda a turma, disse a ela e a outro colega que, por eles serem surdos, estavam dispensados da disciplina.
Michelle no dia de sua posse como professora na UFMG, em 2016 (Foto: Arquivo pessoal)
“Segundo as palavras dele, a disciplina trabalhava os sons e como somos surdos, não seria possível aprender fonologia. Eu me mantive na disciplina e a concluí com conceito B. Por ainda haver pessoas desmotivadoras assim que temos dificuldade de continuar estudando, de crescer e de conquistar o nosso espaço. Inclusive, nesse episódio, o outro colega surdo acabou desistindo do mestrado. É uma pena, pois quem deveria nos levantar, nos derruba”, conta.
Sistema acadêmico e científico para quem?
Na docência do Ensino Superior, a falta de acessibilidade e o capacitismo continuam. “A universidade não foi pensada para as PcD, muito menos para professores com deficiência”, critica Douglas.
Aos questionamentos sobre suas capacidades, Douglas respondeu com muito trabalho e esforço. Hoje, ele é professor da graduação e de dois programas de pós-graduação da UFES. “Já fui escolhido como professor homenageado da turma em cinco semestres e tive boas notas na minha fase de estágio probatório. Isso mostra que eu estou tendo impacto”, completa.
Reprodução/Aliocha Maurício/SEDS
Uma de suas maiores dificuldades como professor com baixa visão é acessar sistemas nada acessíveis, como portal da universidade, Plataforma Lattes, portais de periódicos e de agências de fomento, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“Na pós-graduação precisamos fazer o mesmo trabalho de uma pessoa sem deficiência, mas com as condições que não são dadas. Para fazer uma revisão de literatura, você vai acessar o portal de teses e não é acessível. Você vai preencher seu currículo Lattes e não é acessível. Você vai acessar bibliografias, não tem em braille, em formato digital ou com intérprete, às vezes o espaço físico não é acessível ao cadeirante”, ressalta.
As dificuldades de acesso são tão grandes que o professor precisou contratar um auxiliar com seus próprios recursos. Na justiça, o professor ainda tenta garantir seu direito de trabalhar com um técnico auxiliar pago pela universidade.
O professor Douglas pôde utilizar seus recursos para suprir a falta de acessibilidade, mas nem sempre é assim. Para o professor Décio, a principal barreira é a econômica, já que cada tipo de deficiência exige recursos diferentes e, muitas vezes, de alto valor. “Eu utilizo 95% dos meus recursos, mas penso que a instituição deveria ter esses equipamentos para disponibilizar para docentes e discentes”, afirma.
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Mais inclusão e acessibilidade
Para aumentar a representatividade de docentes com deficiência no Ensino Superior, uma das alternativas é o aumento da reserva de vagas para PcD em processos seletivos. Nos caso das universidades públicas, a lei determina a reserva de até 20% das vagas oferecidas no concurso público para pessoas com deficiência.
Mas, para o professor Décio, na prática, essa reserva de vagas não funciona como deveria: “As cotas não são aplicadas nas vagas como um todo, mas sim em vagas pontuais, precisamos repensar essa distribuição de cotas”.
É imprescindível ainda que a acessibilidade saia do papel e ocorra de fato, tanto nos processos seletivos quanto no ambiente acadêmico. Para Ana Raquel, é fundamental também que haja a diminuição da burocracia para que as PcD tenham acesso aos recursos de acessibilidade necessários.
Ana Raquel e seu pai na sua formatura, em 2017 (Foto: Arquivo pessoal)
Outra política pública que necessita de ampliação é a de bolsas de mestrado e doutorado. Nos últimos anos, as bolsas de pesquisa da CAPES e CNPq têm sido cortadas gradativamente, o que afeta diretamente a permanência de graduandos, mestrandos e doutorandos nas universidades.
“O stricto sensu ainda é muito excludente e vivemos um momento que tende a ser mais e mais, pois os recursos estão cada vez menores. Nessa forma de fazer política pública de educação, vamos ter apenas a perpetuação de representantes de camadas privilegiadas da sociedade no Ensino Superior, como era há 30 anos. Como fazer um doutorado trabalhando? É complicado”, reprova Décio.
O professor ainda defende que sejam ampliadas também as bolsas de mestrado e doutorado profissionais, de graduação e de iniciação científica no Ensino Médio, para garantir a ampliação do acesso das pessoas no Ensino Superior.
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Na opinião do professor Douglas, é preciso que haja o fortalecimentos dos núcleos de acessibilidade das universidades e que os núcleos não foquem apenas nos alunos, mas nos professores e técnicos também.
Na universidade em que Michelle leciona, a prioridade de intérprete é para os alunos surdos, o que dificulta sua rotina enquanto professora. “Se não tiver intérprete, eu fico sem atendimento em reuniões que poderiam contribuir para o meu crescimento, e nas quais eu poderia também dar a minha contribuição, como congregação e várias outras”, afirma.
Michelle faz o sinal da UFMG em libras (Foto: Arquivo pessoal)
Para que haja a inclusão das pessoas com deficiência não só na área da educação como na política, judiciário e em outras carreiras, na visão do professor Décio, a primeira barreira a ser vencida é a do descumprimento de direitos sociais.
“As PcD são pessoas como as outras, mas com algumas especificidades. A pessoa com deficiência também têm outras barreiras para enfrentar relacionadas a sua condição econômica, ao seu gênero, a sua etnia, a sua localização, além das impostas a sua condição”, pontua.