31/10/2025

As 'deficiências por lei' em concursos públicos

Crescimento de candidatos com 'deficiências por lei' em concursos públicos gera debate sobre justiça nas cotas para PcD. Avaliação biopsicossocial é defendida para evitar distorções e garantir direitos.

As 'deficiências por lei' em concursos públicos

Aqueles que acompanham os concursos públicos notam dois fenômenos recentes nas cotas destinadas a pessoas com deficiência.

A Constituição Federal garante entre 5% e 20% das vagas para PcD. Se essas vagas não são ocupadas, elas são revertidas para os candidatos da ampla concorrência. Durante algum tempo, era comum essas vagas não serem totalmente preenchidas, já que muitos candidatos com deficiência não alcançavam a nota de corte. Hoje, no entanto, o cenário se inverteu: quase todas as vagas são preenchidas.

Isso pode parecer um avanço na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho por meio dos concursos.

Contudo, existe um crescimento expressivo do número de candidatos que apresentam laudos de determinados diagnósticos médicos de doenças ou sequelas para concorrer às vagas reservadas a pessoas com deficiência.

Em 2012, a Lei 12.764 reconheceu pessoas com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) como pessoas com deficiência para todos os efeitos legais. Posteriormente, foram reconhecidos como deficiência por lei a visão monocular (Lei 14.126/2021), a surdez unilateral (Lei 14.768/2023), e a fibromialgia neste ano (Lei 15.176/2025).

Essas leis foram celebradas como avanço de direitos, mas, diante da não implementação da avaliação biopsicossocial da deficiência, acaba por gerar distorções.

Ou seja, pessoas com laudos médicos concorrem diretamente com pessoas com deficiências, e isso na prática nem sempre é justo, pois as dificuldades de surdos unilaterais, pessoas com visão monocular e fibromialgia, não tem as mesmas limitações que as pessoas com deficiências físicas, visuais, auditivas, intelectuais ou múltiplas. Acaba sendo injusto e essas pessoas com laudos ocupam vagas que deveriam ser destinadas para aqueles que tem mobilidade realmente reduzida pela sua condição.

É importante destacar que existem candidatos com esses diagnósticos que, de fato, enfrentam barreiras relevantes e vivenciam processos de exclusão social.

Nesse sentido, não cabe atribuir responsabilidade individual aos candidatos, mas reconhecer que eles respondem a incentivos criados pela própria legislação. É a norma jurídica que deve orientar condutas de modo a promover justiça social. Por isso se faz necessária cada vez mais a avaliação biopsicossocial.

Manter o atual desenho, em que apenas o laudo médico é suficiente para que candidatos em situações de “deficiência por lei” concorram nas cotas destinadas às pessoas com deficiência, além de injusto, representa um risco à própria garantia de direitos. Sem critérios claros e sem uma avaliação que vá além do simples laudo médico, a reserva de vagas pode ser percebida como um atalho para alguns oportunistas, sendo uma frustração para muitos.

Diante disso, cabe ao Legislativo e ao Judiciário ponderar os limites do uso exclusivo do diagnóstico médico para caracterizar a deficiência e propor alternativas mais adequadas para contemplar pessoas com restrições leves de funcionalidade. Aos órgãos de controle. É preciso, urgente, implementar a avaliação biopsicossocial, de modo a alinhar a política pública à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e às melhores práticas de justiça social.

Fonte https://revistareacao.com.br/noticias/noticia?id=3cd9c40f-bc47-491c-b4aa-cc9e0c2eac08

Postado Pôr Antônio Brito 

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