
Preconceito, falta de acessibilidade formal e ausência de formação docente adequada dificultam a permanência de autistas nos estudos, alerta a Associação Autistas Brasil
Apesar do aumento da matrícula de pessoas autistas na educação básica, um novo alerta da organização Autistas Brasil evidencia
uma barreira persistente: apenas 0,8% dos adultos autistas com 25 anos
ou mais estão no ensino superior, segundo os dados mais recentes do
IBGE. O índice contrasta com os 18,4% da população geral e revela a
exclusão estrutural que atinge esse público.
Ambientes educacionais pouco adaptados, professores sem formação
sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA), invisibilização de
demandas sensoriais e preconceitos velados são algumas das barreiras
apontadas por pessoas autistas e especialistas consultados pela
entidade. Quase metade dos adultos com TEA não concluiu sequer o ensino
fundamental.
Segundo a Autistas Brasil, o problema não é apenas o acesso: é a
permanência. “O sistema educacional não foi desenhado para corpos e
mentes neurodivergentes. Muitos de nós desistimos não porque não temos
potencial, mas porque a estrutura não nos acolhe”, destaca Guilherme de
Almeida, presidente da organização e pesquisador da Unicamp.
Para o estudante de Medicina Paulo H. O Buffa, de 35 anos, a
trajetória no ensino superior foi marcada por barreiras desde o início.
“Um dos principais obstáculos foi o diagnóstico tardio do autismo, o que
afetou significativamente minha trajetória desde muito cedo. A educação
básica já foi extremamente desafiadora, mas na graduação os desafios se
intensificaram ainda mais”, relata. “Levei mais de um ano, por exemplo,
para ter acesso à monitoria e ao tempo adicional nas provas, algo que
deveria ter sido garantido desde o início. Essa demora e despreparo
criaram barreiras quase intransponíveis para a minha permanência.”
A falta de preparo institucional e o preconceito também deixaram
marcas profundas. “Existe um grande abismo entre o que é prometido nos
editais e o que realmente acontece no cotidiano universitário. Em
situações em que precisei de apoio ou tentei exercer meu direito de
questionar, fui tratado com desdém e desrespeito”, lembra Paulo. “Certa
vez, ao perguntar sobre um conteúdo que não compreendi, um professor
respondeu simplesmente: ‘Porque Deus quis’. Em outro episódio, uma
professora sugeriu que eu buscava por ‘privilégios’ ao tirar uma dúvida
acadêmica durante a aula. Ambos os casos foram levados à reitoria, mas
infelizmente, nenhuma providência foi tomada.”
A Autistas Brasil defende que o enfrentamento da exclusão educacional
deve ser baseado em escuta ativa, adaptação real e formação de
professores. Paulo reforça: “O que teria feito diferença seria, acima de
tudo, coerência entre o discurso institucional e a prática diária. Que a
universidade e seus profissionais realmente entendessem que inclusão
não é um favor, e sim um direito garantido por lei.”
Para ele, a presença de pessoas autistas nas universidades é uma oportunidade de transformação. “Inclusão real exige ação, empatia, escuta ativa e compromisso com a equidade.”
Fonte https://diariopcd.com.br/apenas-08-dos-autistas-adultos-chegam-ao-ensino-superior/
Postado Pôr Antônio Brito