
Neurocirurgião da Unicamp comenta o impacto da oferta da cirurgia na rotina dos pacientes e na saúde pública
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) recomendou a incorporação da estimulação medular1 (em inglês, a SCS – Spinal Cord Stimulation) para dor crônica ao Sistema Único de Saúde após conclusão da consulta pública em julho. A inclusão do procedimento cirúrgico, que já é utilizado na rede privada e em convênios médicos, representa um avanço importante para ampliar o acesso aos pacientes do SUS. A decisão, no entanto, é apenas o primeiro passo: ainda serão necessários trâmites administrativos até que o tratamento esteja disponível na rede pública.
A terapia consiste na implantação de eletrodos e próximo à medula espinhal, que conectados a um pequeno gerador de pulsos (chamado de neuroestimulador e semelhante a um marcapasso), envia estímulos elétricos capazes de bloquear ou mascarar os sinais de dor antes que cheguem ao cérebro. O procedimento é indicado para pacientes que não obtiveram resposta adequada com medicamentos ou outras intervenções. Segundo pesquisas acadêmicas, a técnica alcança taxas de resposta superiores a 80% e está associada à significativa diminuição do uso de analgésicos e melhora na qualidade de vida.2
Antes de chegar à estimulação medular, o paciente precisa passar por todas as etapas do tratamento convencional para dor crônica, que incluem medicações, fisioterapia e outras terapias não invasivas. “Normalmente, indicamos a estimulação medular quando essas alternativas não proporcionam mais alívio. Muitos pacientes já fazem uso de analgésicos potentes, inclusive opioides como morfina, por longos períodos, e ainda assim continuam com dor incapacitante. A terapia só é aplicada quando está bem indicada, após avaliação detalhada e confirmação de que outras opções não foram satisfatórias”, explica o Dr. Marcelo Valadares, pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Unicamp e especialista nas técnicas de neuromodulação.
Indicada para diversos tipos de dor crônica, a estimulação medular pode beneficiar principalmente pacientes com algumas condições, como: a síndrome pós-cirúrgica da coluna vertebral, caracterizada pela persistência da dor mesmo após operações na coluna; síndrome de dor regional complexa (CRPS), condição em que há dor intensa e persistente, geralmente em braços ou pernas, muitas vezes após traumas ou cirurgias; neuropatias periféricas, em que os nervos periféricos apresentam lesões ou disfunções; dor visceral, relacionada a órgãos internos, como abdômen e pelve; e dores isquêmicas periféricas, decorrentes da má circulação sanguínea nas extremidades.3 Estudos também relatam resultados positivos em pacientes com angina refratária, dor abdominal e dor perineal visceral, ampliando o alcance da SCS para diferentes regiões do corpo e causas de dor. 4
Segundo o médico, a incorporação da estimulação medular ao SUS tem grande relevância social, principalmente por ampliar o acesso de pacientes com dor crônica refratária a um tratamento de alto custo que, até agora, estava restrito em grande parte à rede privada.
“Estamos falando de pessoas que convivem com tipos de dores
intensas, muitas vezes incapacitantes, que limitam atividades simples do
dia a dia e podem levar, inclusive, à dependência do consumo de
medicamentos fortes. Ter essa possibilidade no sistema público significa
não apenas reduzir o sofrimento individual, mas também contribuir para
que esses pacientes recuperem autonomia e qualidade de vida, com impacto
direto em sua reinserção social e produtiva”, destaca o Dr. Marcelo Valadares.
Entenda como funciona a cirurgia
De acordo com neurocirurgião funcional da Unicamp, o tratamento é realizado em duas etapas. “Primeiro realizamos um teste de estimulação, com a implantação temporária de eletrodos para avaliar a resposta do paciente. Se houver benefício, passamos para a cirurgia definitiva, em que o eletrodo é conectado a um pequeno gerador implantado sob a pele. O procedimento deixa cicatrizes discretas, a alta ocorre geralmente no mesmo dia ou no seguinte, e os ajustes finos são feitos ao longo das semanas para alcançar o melhor resultado”, explica.
Após o implante, a vida segue normalmente. “Orientamos apenas que o paciente carregue a carteirinha de portador de dispositivo implantável, pois alguns aparelhos podem acionar alarmes em bancos e aeroportos. Os modelos atuais já permitem a realização de exames de ressonância magnética, desde que observadas as condições de segurança em conjunto com o médico”, acrescenta o especialista.
Após o implante, a grande maioria dos pacientes consegue retomar atividades do dia a dia que antes eram limitadas pela dor, como caminhar, trabalhar ou praticar exercícios leves. “O objetivo da estimulação medular é justamente devolver qualidade de vida, autonomia e bem-estar, permitindo que o paciente retome sua rotina com mais conforto e segurança”, conclui o médico.
Referências:
1: Conitec. 144ª Reunião Ordinária – Comitê de Produtos e Procedimentos. Disponível em: https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/reuniao_conitec/2025/pautas-144a-reuniao-ordinaria-da-conitec-comite-de-produtos-e-procedimentos
2: Frontiers in Pain Research. “Spinal Cord Stimulation for Chronic Pain: A Systematic Review and Meta-Analysis.” Publicado em julho de 2025. Disponível em: https://www.frontiersin.org/journals/pain-research/articles/10.3389/fpain.2025.1620289/full
3: Medscape – Spinal Cord Stimulation Overview. Disponível em: https://emedicine.medscape.com/article/1980819-overview
4: PubMed – Spinal Cord Stimulation for Chronic Pain. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/17341047
Fonte https://diariopcd.com.br/conitec-recomenda-incorporacao-da-estimulacao-medular-no-sus-para-tratamento-de-dor-cronica/
Postado Pôr Antônio Brito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário