Você sabe reconhecer uma pessoa com Autismo?
Por Hegle Zalewska
Não acredite em estereótipos! São tantos equívocos em relação à pessoa com autismo que algumas mães, como a Leopoldina Paes, mãe do André, de 42 anos, que tem autismo, ouvem comumente: “seu filho não tem cara de autista, não tem jeito de autista”. Leopoldina afirma, ainda, que: “as pessoas imaginam a pessoa com autismo pelo que veem na mídia: muito inteligentes (gênios) ou muito prejudicados. Seriados atuais mostram gênios esquisitos”.
Em 2012 foi promulgada a Lei Federal que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e estabeleceu diretrizes para sua consecução (Lei N° 12.764, conhecida como Lei Berenice Piana). Essa Lei, que teve iniciativa popular, inseriu a pessoa com espectro autista no rol das pessoas com deficiência.
A referida Lei, ainda, considerou pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) a que possui as características inseridas no Inciso I ou II do parágrafo 1° do artigo 1° que são:
I – deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento;
II – padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.
Diagnóstico do Autismo (TEA)
A forma de diagnosticar o TEA, que até os anos 80 se misturava com o diagnóstico de esquizofrenia, só obteve uma considerável evolução em 2013 com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (a referência mundial para médicos, psicólogos e pesquisadores), em sua edição DSM 5, que indicou os seguintes parâmetros: comunicação social e linguagem; interação social recíproca; e atividade comportamental.
Com a mudança no diagnóstico do autismo vieram, também, os níveis de intensidade do autismo: leve; moderado; e severo.
Os parâmetros de avaliação não podem desconsiderar o respeito à diversidade e características individuais que tornam a pessoa única. Há, também, que se considerar a existência de comorbidades e soma com outras deficiências (por exemplo: a deficiência intelectual), sendo a melhor forma de avaliação para o diagnóstico a avaliação biopsicossocial.
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI – Lei Federal N° 13.146/2015), também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, prevê a regulamentação, pelo Poder Executivo, da avaliação biopsicossocial.
Essa avaliação deve ser feita por equipe multiprofissional e interdisciplinar que considerará os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; a limitação no desempenho de atividades; e a restrição de participação.
O Decreto Federal N° 10.415, de julho de 2020, instituiu o Grupo de Trabalho Interinstitucional sobre o Modelo Único de Avaliação Biopsicossocial da Deficiência. Este grupo teria duração de 90 dias da data da designação de seus representantes e poderia ser prorrogado uma vez por igual período. Entretanto, o Decreto Federal N° 10.611, de janeiro de 2021, alterou o prazo de duração do Grupo para que finalize seus trabalhos até 30 de setembro de 2021. Ou seja, enquanto o Grupo de Trabalho discute a avaliação biopsicossocial, o diagnóstico se dá pelo médico psiquiatra ou neurologista.
Simbolismo e Inclusão
No dia 2 de Abril, Dia Mundial da Conscientização do Autismo, notaremos vários monumentos e edifícios de várias partes do mundo iluminados na cor azul, mas por quê ?
O símbolo mundial da Conscientização do Transtorno do Espectro Autista é constituído da figura de um quebra-cabeça na cor azul. O AZUL representa a maior incidência de casos no sexo masculino, e a peça de QUEBRA-CABEÇA representa a complexidade do autismo e seus diferentes espectros que se encaixam formando o TEA.
Há uma crítica ferrenha em relação a esse simbolismo, pois a ideia de que pessoas com autismo são difíceis de compreender (como um quebra-cabeça) e que a “cura” para o autismo é a peça que falta, é um estigma totalmente contrário ao Princípio da Inclusão.
Infelizmente, há pessoas com TEA que por vários motivos, a despeito de muitos esforços, não conseguem ser incluídas no convívio social. Pessoas com intensidade severa de autismo muitas vezes agridem os familiares e a si mesmas ao ponto de se mutilarem gravemente. Nos casos mais críticos, há risco de morte para familiares (uma realidade chocante que é pouco retratada). O grau de dificuldade na comunicação (com a dificuldade de verbalização das ideias); a dificuldade de adaptação a mudanças; a alta sensibilidade a estímulos sensoriais, como: sons, cores e cheiros; e outras características peculiares, fazem com que a agressividade seja intensificada. Para casos como esse (e outros tão graves quanto o explicitado) o Ministério da Saúde criou a figura das Residências Terapêuticas em Saúde Mental no âmbito do Sistema Único de Saúde (Portaria N° 106/2000, complementada pela Portaria N° 3.090/2011) o que não desobriga o Poder Público a promover toda a espécie de inclusão prevista especialmente na Lei Brasileira de Inclusão e Lei Berenice Piana.
O ensino inclusivo desde a infância, perdurando durante a maturidade em forma de estudo continuado; os espaços pós-escola; aparelhos comunitários para pessoas sem deficiência que estejam preparados adequadamente para atender pessoas com todo tipo de deficiência (na cidade de São Paulo o mais próximo disso seria os CECCOs); projetos para viabilização de exercício da profissão e sistema de emprego apoiado; enfim, tudo o que possa ser caminho propício para o desenvolvimento da pessoa com deficiência e para o alcance de uma vida adulta com mais autonomia (como é o caso da Residência Independente) não pode recair sobre o Terceiro Setor, que sempre supre lacunas à atuação do Poder Público.
Algo óbvio, muitas vezes precisa ser falado. “A pessoa com deficiência também envelhece, e a perda de socialização, o término do ensino médio com ausência de continuidade educacional, fazem com que as habilidades desenvolvidas sejam perdidas”, explica Leopoldina. Complementa, ainda: “Meu filho era feliz, adaptado e foi amadurecendo enquanto frequentava a escola regular. Sempre teve expectativa de ter amigos. Hoje o ambiente dele é só nosso núcleo familiar, ele não é mais o mesmo”.
Lei Municipal de São Paulo N° 17.502/2020
Promulgada em 2020, a Lei Municipal N° 17.502, resultado da pressão dos militantes da causa da defesa dos direitos da pessoa com autismo, dispõe sobre a “Política Pública Municipal para Garantia, Proteção e Ampliação dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares”.
Na prática, ela reforça os direitos já existentes na Constituição Federal, na Lei Brasileira da Inclusão e em outras normas que garantem o bem-estar da pessoa com deficiência e integra as ações das Secretarias da Saúde, Educação e Assistência Social, trazendo para si a responsabilidade direta da promoção da inclusão social, “priorizando a autonomia, protagonismo e independência das pessoas com TEA”. Importante ressaltar que o fato de haver uma legislação municipal que traz para si responsabilidades diretas, independente dessas já haverem sido previstas em outras legislações ou abarcadas de forma ampla na Constituição Federal, facilita a propositura de ações judiciais contra o Município.
Ou seja, na teoria, a Lei N° 17.502/2020 facilita a fiscalização e a interação no desenvolvimento e realização da Política Pública Municipal em prol da pessoa com TEA.
E para discutir exatamente a prática dessa Política Pública Municipal, a Associação Paulista de Autismo e a APABB – Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência, de Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade, aproveitaram as preparações das comemorações do Dia Mundial da Conscientização do Autismo para idealizar um WEBINÁRIO que se realizará nos dias 31 de Março; 01 e 02 de Abril de 2021.
No dia 31/03, às 16h, a Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência, o Ministério Público do Estado de SP e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo farão apontamentos de acordo com sua ótica da Lei N° 17.502/2020;
No dia 01/04, às 16h, haverá um debate sobre o que existe atualmente na área da educação saúde e assistência social na Cidade de São Paulo e de que forma a Lei N° 17.502/2020 amplia ou melhora as condições já existentes;
E no dia 02/04, às 16h, haverá relatos de pessoas que foram ativistas na elaboração da Lei N° 17.502/2020 e qual o impacto no dia-a-dia dessas pessoas.
As LIVES serão transmitidas pelas páginas do Facebook das Organizações idealizadoras:
https://www.facebook.com/associacaopaulistadeautismo
https://www.facebook.com/onormaleserfeliz
* Hegle Machado Zalewska é Advocacy; Comunicadora; Desenvolvedora de Projetos; Produtora de Conteúdo de Políticas Públicas; Advogada Especializada em Direito Digital.
E-mail: heglemz@yahoo.com.br
Fonte https://revistareacao.com.br/dia-mundial-da-conscientizacao-do-autismo/
Postado por Antônio Brito
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