16/03/2021

Os Direitos da Pessoa com Deficiência como CONSUMIDORA

* Por Dra. Tatiana Viola de Queiroz

No dia 15 de março se comemora o Dia Internacional do Consumidor, mas você sabe a razão da escolha da data?

Esse dia foi escolhido pois em 15 de março de 1962, o então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, enviou uma mensagem ao Congresso Americano tratando da proteção dos interesses e direitos dos consumidores. “Consumidores somos todos nós“, disse ele nessa fala que se tornou o marco fundamental do nascimento dos chamados direitos dos consumidores e que causou grande impacto nos EUA e no resto do mundo.

Nesse discurso foram consagrados determinados direitos fundamentais do consumidor, o direito à segurança, o direito à informação, o direito à escolha e o direito a ser ouvido.

Em nosso ordenamento jurídico, o Direito do Consumidor está elencado no artigo 5º que trata, justamente, das garantias fundamentais e dos direitos individuais e coletivos.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (Art. 2º – caput)

Todo e qualquer consumidor é vulnerável em uma relação de consumo, como determina o inciso I do artigo 4º do CDC, pois, somente o fornecedor conhece o seu produto e serviço e todo o seu processo de produção, dessa forma, mesmo o consumidor com maior poder aquisitivo, ou com muitos diplomas, ainda assim, será vulnerável.

E o que é uma relação de consumo? É a relação existente entre o consumidor e o fornecedor na compra e venda de um produto ou na prestação/utilização de um serviço. É o vínculo jurídico dotado de características próprias sobre o qual incide o microssistema denominado Código de Defesa do Consumidor.

Como vimos, todo consumidor é vulnerável, no entanto, há alguns grupos de consumidores que podem ser enquadrados como hipervulneráveis, como os analfabetos, as crianças, os idosos, os doentes e as pessoas com deficiência.

A hipervulnerabilidade pode ser definida como uma situação social fática e objetiva de agravamento da vulnerabilidade da pessoa física consumidora, em razão de características pessoais aparentes ou conhecidas pelo fornecedor.

Segundo a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela ONU em 13 de dezembro de 2006 (Decreto nº 6.949/2009), pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, sancionado em 2015, garantiu uma série de direitos a aproximadamente 45 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. Isso representa quase 25% da população, segundo o último levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019. Esse número representa quase 25% da população do país.

A Deficiência, segundo o Estatuto, é “uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social”.

Apesar do Código de Defesa do Consumidor não dizer expressamente no artigo 2º que a pessoa com deficiência é consumidora e merece atenção especial, implicitamente diz, pois, o CDC é uma legislação principiológica, ou seja, traz princípios maiores que regem a relação de consumo e, apesar de não trazer um passo a passo ou itens específicos sobre cada situação, toda e qualquer situação e todos os problemas gerados de uma relação de consumo podem ser resolvidos com base no CDC.

Por exemplo, são direitos básicos do consumidor, elencados nos incisos II e III do artigo 6º de referida legislação, a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações, e a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

Assim, quando o CDC traz que o consumidor tem direito a informação adequada e clara já diz que deve atingir a toda pluralidade de consumidores, pois, todos os consumidores têm direito de ter acesso à correta informação.

No entanto, para não deixar dúvidas, em 2015, foi inserido o parágrafo único no artigo 6º que trouxe: A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento.

É fundamental saber que, quando falamos de relação de consumo, o código de Defesa do Consumidor é a lei máxima (sem mencionar a Constituição Federal que é a lei máxima de todos os assuntos, é claro), com isso, toda a qualquer outra legislação que aborda assuntos relacionados ao Direito do Consumidor, deve passar pelo crivo do CDC, sob pena de ilegalidade.

As demais legislações só podem detalhar direitos, nunca excluí-los!!!!

No setor de prestação de serviços, a pessoa com deficiência consumidora enfrenta inúmeros desafios, como o setor de turismo e lazer, por exemplo. A falta de preparo dos prestadores de serviços, as barreiras arquitetônicas, o poder aquisitivo insuficiente para arcar com custos extras decorrentes das necessidades especiais e desinteresse tanto da população quanto do governo no que tange à inclusão dessas pessoas são alguns dos problemas enfrentados.

Um exemplo disso são os parques de diversão. Além das deficiências físicas precisamos lembrar das deficiências intelectuais e os autistas. Para um autista, além do preparo da equipe para receber esse consumidor, há necessidade de avisos sobre cada atração que possam desencadear crises pela superexposição à estímulos visuais, auditivos e sinestésicos. No entanto, no Brasil ainda não vemos em nenhum estabelecimento de lazer esse tipo de informação que deve ser prestada previamente ao ingresso desse consumidor em cada atração, justamente para evitar a crise (dano).

O CDC também traz normas que asseguram a qualidade de prestação de serviços públicos, bem como o bom atendimento ao consumidor em serviços públicos – tanto os serviços da Administração Pública, quanto por suas concessionárias. E, uma vez que as pessoas com deficiência, muitas vezes, precisam utilizar os serviços públicos, é importante saber que devem e podem exigir que tais serviços sejam prestados de forma a atender também os seus direitos específicos e isso inclui a acessibilidade em todas as suas formas.

Por exemplo, a Lei de Acessibilidade no Brasil foi oficializada pelo decreto n° 5296, publicado em dezembro de 2004. Ela regulamenta duas outras leis, a de n° 10.048/2000, que concede prioridade no atendimento às pessoas com deficiência, e a de n° 10.098/2000, que estabelece normas e critérios para a promoção da acessibilidade.

Analisando-a sob a ótica consumerista, todos os estabelecimentos comerciais devem respeitá-la oferecendo a seus consumidores tanto a prioridade quanto a acessibilidade. E isso não deve nem ser encarada como estratégia de marketing, pois é dever especificado em lei.

Nos estabelecimentos físicos a acessibilidade inclui rampas, portas mais largas nos banheiros, torneiras e secadores automáticos, placas indicativas, avisos sonoros, cardápio em braile, entre outros.

A Lei Brasileira de Inclusão detalhou alguns direitos já garantidos no Código de Defesa do Consumidor, mas, diante dos repetidos descumprimentos, tais detalhamentos são extremamente necessários.

Para os sites há necessidade de adequação aos consumidores com baixa visão e ferramenta de voz para aqueles sem nenhuma visão, as informações divulgadas no endereço devem ser acessíveis conforme as diretrizes adotadas internacionalmente, com opções de contraste, áudios e vídeos.

Para o serviço de telefonia a lei determina que empresas prestadoras de serviços de telecomunicações garantam pleno acesso à pessoa com deficiência e isso inclui recursos como disponibilizar demonstrativo de pagamentos em braile e canais de comunicação adequados para atender consumidores com deficiência visual, auditiva ou de fala.

Os Serviços de radiodifusão de sons e imagens (televisão) devem possibilitar o uso de recursos como a subtitulação por meio de legenda oculta, janela com intérprete de libras e audiodescrição.

Para o comércio, caberá aos fornecedores de produtos ou serviços disponibilizar os recursos de acessibilidade para que anúncios publicitários veiculados na mídia impressa, na internet, na rádio e na televisão sejam compreensíveis para todos os consumidores. Também é dever do fornecedor oferecer exemplares de bulas, prospectos, textos ou qualquer outro tipo de material de divulgação em formato acessível mediante solicitação do consumidor.

A lei também determina para todos os brasileiros com deficiência o acesso facilitado a produtos, recursos e serviços de tecnologia assistiva que maximizem sua autonomia e mobilidade pessoal. Para implementar isso, a lei prevê a oferta de linhas de crédito subsidiadas para aquisição dos recursos, reduzir a tributação da tecnologia assistiva e agilizar a inclusão de novos recursos no rol de produtos distribuídos pelo SUS.

Essa determinação detalha o direito ao acesso à informação do artigo 6º como visto acima.

Como determina o artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor, toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

Ou seja, se uma oferta for feita sem respeitar as particularidades das pessoas com deficiência e essas, de boa-fé, entenderem algo diferente do que foi anunciado e, de boa-fé, exigir o cumprimento de tal oferta, o fornecedor deve cumprí-la.

Para facilitar, vamos dar um exemplo. Suponhamos que um consumidor com deficiência visual vai comprar um imóvel e, por ser bastante independente, visita o stand sozinho. Em tal visita, o fornecedor informa que a metragem é de 60m2, no entanto, o imóvel tem 50m2. Essa informação está no folheto, contudo, este não possui leitura em braile, nem há outro meio do consumidor, naquele momento, ter acesso a essa informação e compra o imóvel, acreditando que possui os 60m2 informados. Nesse caso, o consumidor tem o direito de exigir que esses 10m2 faltantes sejam compensados de alguma forma, uma vez que a oferta não foi feita de forma adequada às suas limitações e o induziu ao erro.

O art. 43 do CDC, que trata do acesso às informações em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre o consumidor também foi alterado pela Lei de Inclusão, mais uma vez detalhando direitos.

O novo inciso estabelece que todas as informações devem ser disponibilizadas em formatos acessíveis para a pessoa com deficiência, mediante solicitação do próprio consumidor.

O fornecedor que não se adequa à legislação, além de estar cometendo uma ilegalidade, ainda está perdendo inúmeros negócios e oportunidade de lucro, pois todas essas pessoas são potenciais consumidores.

Infelizmente, pela falta de adequação, podem não ser atingidas pela publicidade pois, a falta de recursos como audiodescrição, língua brasileira de sinais (libras) e legendagem descritiva impede que o consumidor com deficiência não tenha nem acesso ao produto ou serviço. Inclusive, podem nem conseguir fazer uma compra no site por encontrar barreiras de navegação ou na loja física por falta de acesso.

A escolha de um produto por uma pessoa com deficiência depende de vários fatores – desde acessibilidade no momento da compra até o fato de se sentirem representados por alguma publicidade.

Esse público nunca foi representado, nem pensado no momento de decisão das peças publicitárias ou estratégias de comunicação, o que não gerava sensação de pertencimento.

Uma pessoa com deficiência física, por exemplo, não conseguia se imaginar utilizando um produto, justamente porque não via ninguém na mesma condição nas publicidades. Já uma pessoa com deficiência visual não consegue comprar um produto de beleza ou um tênis pela internet pela falta de descrição das imagens dos produtos disponíveis.

Em 2016 foi feita uma pesquisa pela Nielsen e em tal estudo se verificou que as pessoas com deficiência tendem a ser mais leais com uma marca quando percebem que ela atende às suas necessidades.

Em outro estudo publicado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, nomeado “Inclusão de pessoas com deficiência na publicidade: um estudo sobre a comunicação acessível da marca Avon a partir da campanha Dona Dessa Beleza”[1]

“Considerando que a população com deficiência no Brasil é formada por mais de 45,6 milhões de pessoas, o que representa uma parcela de 23% da população total do país, pelo menos 45 milhões de pessoas quase nunca são lembradas pelas marcas e campanhas publicitárias, nem representadas na mídia. Isto contribui para reforçar o preconceito existente na sociedade acerca das pessoas com deficiência. Quando uma marca dá visibilidade a estas pessoas, enquanto mídia, está cumprindo com seu papel de eliminar ideias negativas formadoras de estigmas e construir uma imagem positiva e humana da pessoa com deficiência através da comunicação, como proposto por Fletcher (1996) e Sassaki (2006).”

A empresa Croma Marketing Solutions divulgou, em novembro de 2017, um estudo Oldiversity®, com o objetivo de analisar os impactos da longevidade e diversidade para marcas e negócios no Brasil.[2]

O estudo mostrou o despreparo do comércio para atender uma pessoa com algum tipo de limitação física, provando, mais uma vez, que a deficiência também se apresenta como barreira nos ambientes sociais. As principais reivindicações desse público são recursos acessíveis e atendimento especializado, temas considerados prioritários para 70% dos participantes.

As pessoas com deficiência gostariam de vê-las nas propagandas, o mesmo acontece para o atendimento nas lojas físicas. O problema é que, segundo a pesquisa, 62% dos entrevistados acreditam que as empresas ainda mantêm grande preconceito sobre a contratação de pessoas com deficiência. E mais: 7% dos participantes ainda acham estranho serem atendidos por quem tem algum tipo de deficiência.

Em entrevista para o jornal Estadão o presidente da Croma Solutions, Edmar Bulla, afirmou que[3]

“Os desejos dos consumidores com deficiência não são atendidos porque as empresas não conseguem compreender o potencial desse mercado”.

O Procon-SP em 2019 realizou uma pesquisa[4] e concluiu que a pessoa com deficiência ainda enfrenta, na maioria das vezes, tanto no mercado físico como no online, dificuldades para exercer seu direito de consumidor e que os fornecedores ainda estão despreparados para atender esse público.

É fundamental que os fornecedores façam investimentos em treinamento de pessoal, já que foi apontada pela grande maioria a falta de preparo dos atendentes, inclusive os do SAC – Serviço de Atendimento ao Consumidor.

A existência de barreiras arquitetônicas e obstáculos físicos, falta de sinalização, portas e elevadores com medidas inadequadas, que dificultam ou impedem a entrada e a ausência de banheiros acessíveis também são obstáculos apontados pelos entrevistados.

Além disso, os resultados indicam que investimentos em tecnologia são primordiais para melhorar e garantir a acessibilidade dos consumidores com deficiência, tanto na produção das embalagens dos produtos, quanto nos sites que vendem online.

Quando falamos sobre direitos dos consumidores das pessoas com deficiência não podemos deixar de abordar um assunto muito triste, o fato de que muitas pessoas adquirem a deficiência por defeito no produto ou no serviço quando ocorre um acidente de consumo. Por exemplo, quando por conta de uma falha no freio o consumidor sofre um acidente e se torna paraplégico. Em casos como esse, o fabricante do automóvel (fornecedor) tem a responsabilidade de reparar os danos sofridos, não só com o automóvel, mas com todo o tratamento médico que o consumidor necessitar e, sendo irreparável o dano (paraplegia) deve-se indenizá-los por danos morais, lucros cessantes e uma possível pensão vitalícia.

Caso o acidente atinja outras pessoas que não são os destinatários finais do produto ou serviço, o fornecedor também será responsável por todas as vítimas envolvidas no acidente, que se tornam consumidores equiparados.

Por isso, é muito importante que os fornecedores tenham consciência da responsabilidade que possuem quando colocam um produto ou serviço no mercado de consumo.

Infelizmente, muitos fornecedores desconhecem a legislação e, quando conhecem, pensam nos gastos que terão para se adaptarem e, com isso, não a respeitam como deve ser, mas cabe a nós, sociedade, exigir o respeito integral a essa legislação consumerista que é uma das mais modernas do mundo.

  • Dra. Tatiana Viola de Queiroz – Advogada, sócia fundadora do Viola & Queiroz Advogados, Pós Graduada e especialista em Direito do Consumidor e em Direito Bancário, Pós Graduada e especialista em Direito Médico e da Saúde, Pós Graduanda no Transtorno do Espectro Autista pela CBI of Miami.  Pós Graduanda em Direito Empresarial. Membro Efetivo da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB São Paulo. Professora de Direito do Consumidor no CEPMA. Contato (11) 98863-2023, www.violaequeirozadvogados.com.br e redes sociais: @violaequeirozadvogados

[1] https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/181686 – acesso em 14 de março de 2021

[4]  https://www.procon.sp.gov.br/pessoa-com-deficiencia-e-o-mercado-de-consumo/

Fonte  https://revistareacao.com.br/os-direitos-da-pessoa-com-deficiencia-como-consumidora/

Postado por Antônio Brito 

15/03/2021

Convênio que concede isenção de ICMS ao público PcD é prorrogado

O CONFAZ discutiu hoje (12) em mais uma reunião extraordinária a concessão do Convênio 38/12 que concede ao público PcD a isenção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e a decisão tomada foi a de manutenção por mais 12 meses e teto de R$ 70 mil, vigente desde 2009, inalterado.

A informação exclusiva vem do Sistema Reação que realizou uma live no início da tarde de hoje com alguns convidados, inclusive Otávio Leite – Deputado Federal pelo RJ, forte defensor do reajuste do teto para o público PcD, além de ir contra a MP 1034. O parlamentar foi quem divulgou a informação de forma exclusiva, argumentando que recebeu de fonte oficial que o Convênio foi renovado.

Fonte  https://mundodoautomovelparapcd.com.br/convenio-que-concede-isencao-de-icms-ao-publico-pcd-e-prorrogado/

Postado por Antônio Brito 

14/03/2021

Homens de Honra: vencendo o preconceito e os próprios limites

A discussão em torno do preconceito nunca esteve tão à flor da pele em nosso país e no mundo. Seja a discriminação racial, sexual ou referente à classe econômica do indivíduo em questão, o combate ao preconceito deve ser feito em todas as esferas da sociedade, e claro que a corporativa não poderia ficar de fora. Quando o tema é mais especificamente o preconceito racial e as formas de combatê-lo nos ambientes de convivência social, poucas histórias são tão potentes quanto a deste Homens de Honra (Men of Honor, EUA, 2000), filme que além de expôr as mazelas do preconceito, ainda funciona como um tremendo exemplo em torno da superação de nossos próprios limites.

O filme conta a história verídica de Carl Brashear (Cuba Gooding Jr., de Jerry Maguire: A Grande Virada, outro filme que já abordei aqui na coluna de cinema do Portal Administradores). Negro, filho de uma família humilde que trabalha na lavoura e sem um diploma do ensino médio, ele se alista na Marinha Americana logo após a Segunda Guerra Mundial. O presidente Harry Truman havia integrado os negros no alistamento, mas a Marinha não. Ou seja, os negros que chegavam após se alistarem recebiam duas escolhas; Poderiam ser cozinheiros ou ajudantes dos oficiais. Brashear queria ser um mergulhador, e Homens de Honra conta a história de como ele se tornou um apesar de tudo o que sofreu, primeiro com o preconceito relacionado à sua cor, e depois com um terrível acidente que amputou a parte inferior de uma de suas pernas, à princípio impedindo-o de continuar na função.

O filme é uma biografia à moda antiga, e eu digo isso como um elogio. Não há nada de cenas de ação inventadas para tornar a história retratada menos real e de maior apelo ao público. Homens de Honra preocupa-se em seguir a curva da vida de Brashear especialmente quando ela se cruza com a de outro homem, o Marinheiro-Chefe Billy Sunday (o grande Robert De Niro), um redneck que à princípio nutre somente ódio por Carl, mas que aos poucos vai mudando de ideia sobre o homem.

A cena mais impressionante e empolgante do filme é o inverso do heroísmo mostrado em tantos outros filmes envolvendo temática militar. Não é sobre ação ou explosões, mas sobre garra e tenacidade, e grande parte desta cena acontece em nossa própria imaginação. Para conseguir se formar na escola de mergulho, os candidatos fazem um teste onde eles devem montar uma bomba de sucção formada por inúmeras peças, enquanto trabalham praticamente no escuro, debaixo d'água. O teste de Brashear foi sabotado de forma que seria praticamente impossível para ele passar. A água está tão fria que muito tempo de submersão pode ser fatal para o mergulhador em questão. E hora após hora, Brashear permanece lá embaixo, tentando completar a tarefa.

O personagem de De Niro é estritamente contra a ideia de negros ingressando na Marinha, mas antes de qualquer coisa, seu Billy Sunday é um marinheiro, e quando você ama muito uma coisa, você passa a respeitar aqueles que fazem a mesma coisa de maneira competente. Nem preciso mencionar que é assim também na vida corporativa. Ser um bom profissional envolve antes de qualquer coisa o amor pela profissão, que evolui para outras qualidades que na maioria das vezes, nem fazemos ideia de que as possuímos.

Apesar da oposição de Sunday, o principal oponente de Brashear consiste na figura de "Mister Pappy" (o falecido Hal Holbrook), o Oficial Comandante do grupo, cujo racismo exala de cada um de seus poros. "Talvez chegue o dia em que um mergulhador negro se forme nesta escola," ele profere, "mas não enquanto eu estiver aqui."

Cuba Gooding Jr. é (ou pelo menos costumava ser nesta época) o tipo de ator que demonstra grande energia em cena. Este tipo de energia não seria apropriada aqui, e ele sabiamente abaixa um pouco o tom e entrega uma performance forte e convincente. O segredo do sucesso de seu personagem não é complicado de se entender: Ele simplesmente não desiste e não vai embora, e eventualmente sua presença passa a envergonhar os homens da Marinha que não conseguem negar suas habilidades. O racismo que permeava a sociedade nos anos 40 é elemento presente em toda a narrativa do filme. Mas não se iluda; este mesmo racismo ainda reflete suas engrenagens corruptas na sociedade e no mercado de trabalho do mundo atual. Se Carl Brashear fosse um de nossos cidadãos contemporâneos, imagino que ele também encontraria a barreira do racismo interferindo em seus objetivos.

Brashear enfrentou as teias do racismo mesmo depois de se tornar o primeiro mergulhador negro da Marinha Americana. Anos depois de sua formação, um acidente leva uma de suas pernas logo abaixo do joelho. Brashear, tenaz como sempre, se recupera de maneira sensacional, desta vez contando com a improvável ajuda de Billy Sunday. A sequência final do filme, em que Brashear precisa provar aos oficiais da Marinha que é capaz de exercer a função mesmo depois do acidente tornou-se emblemática. Interpretada de maneira sublime por Gooding Jr. e De Niro, a sequência empolga e emociona, e resume toda a luta de um admirável ser humano contra todas as barreiras que lhe foram impostas pelas circunstâncias de sua vida.

Homens de Honra é o segundo filme do diretor George Tillman Jr., que depois de um longo hiato, retornou recentemente com o bom drama The Hate U Give (2018), onde volta a discutir as questões raciais nos Estados Unidos. Seu Homens de Honra está longe de ser um filme perfeito, mas sua história forte, performances sólidas e simplicidade falam ao coração do espectador, pois a força central da produção ressalta a importância do caráter humano frente às adversidades. Nós como indivíduos temos a tendência de glorificar heróis do esporte e outras vertentes menos nobres, mas e quanto a homens como Brashear, que queriam apenas servir o seu país e não aceitam um "não" como resposta? Quando chegará a vez dos verdadeiros heróis de nossa sociedade decadente ganhar seus devidos lugares e serem respeitados como os verdadeiros heróis que são? O racismo e a discriminação por qualquer outro aspecto humano existem, mas não é através de sistemas de cotas, do vitimismo e de manifestações medíocres e apelativas que isso um dia vai mudar. É através do caráter e do trabalho.

Fonte  https://administradores.com.br/artigos/homens-de-honra-vencendo-o-preconceito-e-os-pr%C3%B3prios-limites

Postado por Antônio Brito 

Festival Nacional de Contadores de Histórias terá acessibilidade

Apresentações e oficinas serão transmitidas pela internet (Foto: Divulgação)

Para marcar o Dia Nacional do Contador de Histórias, celebrado em 20 de março, 19 profissionais de diferentes regiões do Brasil estarão reunidos no 1º Festival Nacional de Contadores de Histórias, no Ciberespaço.

Contemplado pelo Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (ProAC), com recursos da Lei Aldir Blanc, o festival terá apresentações transmitidas pelas redes sociais, além de oficinas com conteúdos que desvendam as técnicas e os encantamentos do tema.

Todas as atividades contarão com recursos de acessibilidade, como tradução em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e audiodescrição.

“Nosso desejo é o de fomentar e difundir a arte da narração de histórias, criar um espaço de partilha e pesquisa entre artistas e público, compartilhar saberes a partir de oficinas gratuitas e manter viva a fogueira da nossa própria história a partir da contação, valorizando a nossa identidade regional, cultural e ancestral”, destaca o contador de histórias Ademir Apparicio Júnior, idealizador do festival.

1º Festival Nacional de Contadores de Histórias

Imagine mergulhar num Brasil carregado de sotaques, mistérios, sabores e aromas. Durante os sete dias de agenda, o internauta poderá conferir uma programação intensa que revisita as identidades regionais de maneira lúdica e poética.

Após o show de abertura ‘Palavra Tagarela’, sobre tradição oral e elementos do folclore com os artistas Poliana Savegnago, Allan George da Silva, Márcio Bah e Devanir Mille, o público poderá acompanhar dez apresentações, que reunirão os contadores de histórias Aline Alencar e Auritha Tabajaras (região Nordeste), Joca Monteiro e Joana Chagas (região Norte), Ciro Ferreira e Rosilda Figueiredo (região Centro-oeste), Camila Genaro e Cia ‘Ih, Contei!’ com Elton de Souza Pinheiro, Leandro Pedro da Silva e a fantoche Tifanny MeiaLoka (região Sudeste), Liz Ângela de Almeida e Lucélia Clarindo (região Sul), além de dez oficinas.

Para encerrar essa agenda caprichada, os artistas Ademir Apparicio Júnior, Fabiana Massi, Andrés Felipe Giraldo e Cimara Gomes Ferreira Fróis apresentam ‘A história de Maria Dançarina ou A menina que desafiou o demo’.

Patrimônio cultural imaterial

A arte de contar histórias é um ‘patrimônio cultural imaterial’, acentua Ademir. “Por meio das histórias relembramos nossas lendas, nossos antepassados, construímos futuro e presente. As histórias podem ser ferramentas para aprendizagens de diferentes áreas, como a geografia, a matemática, a ciência, a filosofia, e até mesmo para difusão da literatura. Os contos são capazes de nos transportar para outros espaços”, resume.

O idealizador aponta, ainda, a importância ‘singular’ para a fruição e troca entre os contadores, o público e as histórias: “É uma oportunidade de fazer com que a promoção à leitura aconteça de maneira lúdica e potente, podendo assim aproximar o ouvinte e leitor ao fantástico universo das interpretações produzidas pelas linguagens da palavra, do corpo, da voz e de tantos outros elementos, que serão combustíveis para o faz de conta acontecer na sua plenitude”.

O festival, com todo o encanto dessa arte, não poderia ocorrer em outra data. O seu encerramento em 20 de março marca a comemoração do Dia do Contador de Histórias, criado em 1991, na Suécia, com o principal objetivo reunir os contadores e promover a prática em todo mundo.

Confira a programação das apresentações:

14/03, às 14h30: Show de Abertura: Palavra Tagarela
Com Poliana Savegnago, Allan George da Silva, Márcio Bah, Devanir Mille

15/03, às 10h: Histórias Aya
Contadora: Liz Ângela Gonçalves Almeida

15/03, às 14h: História da Mala e da Cachola e o Conto: o couro do pandeiro
Contadores: Lucélia Clarindo e João Carvalho

16/03, às 10h: Cardápio de Lendas Caiçaras
Contadora: Camila Genaro

16/03, às 14h: Histórias para brincar
Contadores: Ih, Contei! (Elton de Souza Pinheiro, Leandro Pedro da Silva e a fantoche Tifanny MeiaLoka)

17/03, às 10h: O Afeto das Histórias
Contador: Ciro Ferreira

17/03, às 14h: A fruta desconhecida
Contadora: Rosilda Figueiredo

18/03, às 10h: Ê boi! A lenda do bumba meu boi
Contadora: Cia. Forrobodó de Teatro (Aline Alencar)

18/03, às 14h: A onça pintada que nasceu no pescoço da kunhataim
Contadora: Auritha Tabajara

19/03, às 10h: Atividade: A mulher que fazia chover
Contadora: Joana Chagas

19/03, às 14h: Histórias da Encantaria Amazônica
Contador: Joca Monteiro

20/03 – 14h: Encerramento ‘A história de Maria Dançarina ou A menina que desafiou o demo
Com: Tem História na linh@! (Ademir Apparicio Júnior, Fabiana Massi, Andrés Felipe Giraldo e Cimara Gomes Ferreira Fróis)

Confira a programação das oficinas:

15/03, às 15h: Oficina de contos afro
Ministrante: Liz Ângela de Almeida – Duração: 2h
Público-alvo: Oficina para adultos – maiores de 18 anos – Acadêmicos de pedagogia, Acadêmicos de letras, Magistério, formação de docentes

15/03, às 19h: A leitura em verso e prosa
Ministrante: Lucélia Clarindo – Duração: 2h
Público-alvo: Pessoas interessadas na arte de contar as próprias histórias, em verso e prosas, a partir dos 18 anos

16/03, às 15h: Fios da Narrativa – os recursos internos para contar histórias em diversos espaços 
Ministrante: Camila Genaro – Duração: 3h
Público-alvo: Professores, Psicólogos, cuidadores, educadores, Pais, Mães, Avós, Avôs e outros Responsáveis por Crianças que queiram ter um vínculo afetivo e duradouro através das histórias, com idade superior a 18 anos

16/03, às 19h: Arte de criar brinquedos e contar histórias
Ministrante: Ih, Contei! – Duração: 2h
Público: Livre

17/03, às 15h: Histórias na sala de aula
Ministrante: Ciro Ferreira – Duração: 2h
Público-alvo: Professores, bibliotecários, brincantes, artistas, fazedores de danuras e pessoas interessadas na arte da oralidade

17/03, às 19h: O brincante que mora em mim
Ministrante: Rosilda Figueiredo
Público-alvo: Contadores de Histórias, atores, professores, brincantes e interessados na arte da oralidade

18/03, às 15h: A arte de contar histórias
Ministrante: Aline Alencar – Duração: 2h
Público-alvo: Contadores de Histórias, atores, estudantes de teatro, professores e interessados na arte de contar histórias

18/03, às 19h: O grafismo indígena
Ministrante: Auritha Tabajaras – Duração: 2h
Público-alvo: Contadores de Histórias, atores, estudantes de teatro, professores e interessados na arte de contar histórias

19/03, às 15h: Nós, As Matintas
Ministrante: Joana Chagas – Duração: 2h30
Público-alvo: Mulheres a partir de 16 anos (estudantes, mães, avós, professoras, contadoras de histórias e mediadoras de histórias)

19/03, às 19h: A interpretação para a arte de contar histórias
Ministrante: Joca Monteiro – Duração: 3h
Público-alvo: Contadores de histórias, professores e agentes de leitura (a partir de 12 anos)

Para acompanhar acesse o YouTube, o Facebook e o Instagram.

Fonte  https://www.portalacesse.com/festival-de-contadores-de-historias/

Postado por Antônio Brito 

Mês da síndrome de Down

* Por Cristiane Zamari Diogo (Cris Zamari)

Quero falar um pouquinho sobre a síndrome associada à apraxia de fala.

Esse é o Bernardo, hoje com 15 anos, no vídeo tinha 13.

Um dia me disseram que ele não ia falar. Aliás, já me disseram que ele não faria muitas coisas que faz hoje.

Quando finalmente descobrimos a apraxia de fala, me disseram que ele não ia formar sílabas, formar frases ou cantar.

De fato, no estágio inicial da apraxia mais severa, a pessoa não consegue “juntar” a consoante com a vogal, então ele falava: “im” ao invés de “sim”, por exemplo.

Eu senti uma tristeza quando recebi a notícia, porque ela me foi lançada sem nenhuma orientação do que fazer com isso, e confesso que depois até fiquei um período sem força pra continuar persistindo em ensiná-lo todos os dias.

Quando você ouve de profissionais que seu filho está decretado à impossibilidades, é como se de alguma forma você tenha que acatar, por ser a fala de alguém com formação em uma área que teoricamente você não domina, e com certeza sabem mais do que você.

Mas quando se trata de filhos, não existem limites para continuar indo em busca de novas perspectivas, técnicas, estratégias e formações.

Por isso, fui em busca de cursos com profissionais especializados em Apraxia de fala, que me fizessem entender qual seria a melhor forma de ajudar o Be.

Aprendi muito sobre a “comunicação alternativa” que não era necessariamente através da fala, e com isso pude entender que existem diversas formas de comunicação eficazes.

Inclusive a língua brasileira de sinais, que também uso com o Be em alguns momentos.

Hoje, posso dizer que nunca vou buscar por uma “dicção perfeita”, mas vou continuar estimulando meu filho a evoluir e acreditar que ele pode subir degraus se eu der oportunidades pra isso, não tratá-lo como um coitado ou uma pessoa limitada, ou fazer das dificuldades enfrentadas um fardo, mas sempre um desafio lançado.

Porque a vida sempre será feita de desafios, e estamos no mundo para enfrentar e aprender com cada um deles.

Esse vídeo retrata a nossa felicidade (dele e minha) em conseguirmos cantar essa música juntos!

Momentos que não tem preço, e eu quis compartilhar com todo meu amor…

· Cristiane Zamari Diogo(Cris Zamari), mãe do Bernardo – com Síndrome de Down é Coordenadora de Defesa de Políticas para
Pessoas com Deficiência na Prefeitura Municipal de Santos/SP e Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB Santos/SP. No Instagram @criszamari e no Facebook @Cristiane Zamari Diogo

Fonte  https://revistareacao.com.br/mes-da-sindrome-de-down/

Postado por Antônio Brito 

Atletas paralímpicos brasileiros fazem intercâmbio digital com mais de 800 crianças japonesas

Atletas brasileiros que devem disputar os Jogos Paralímpicos de Tóquio em agosto de 2021 participaram de um intercâmbio digital com alunos japoneses do ensino fundamental da cidade de Hamamatsu, onde a delegação brasileira fará o período de aclimatação para o megaevento. Ao todo, 846 crianças participaram dos cinco bate-papos virtuais que fizeram parte da ação.

Cada bate-papo contou com a presença de dois atletas da mesma modalidade. Eles conversaram sobre as expectativas para os Jogos de Tóquio e responderam perguntas dos alunos durante a atividade que reuniu cinco escolas japonesas:  Nishi, Sunaoka, Miyakoda Minami, Hachiman e Sanarudai.

Os atletas que participaram do intercâmbio foram os nadadores Daniel Dias (classe S5, para atletas com deficiência físico-motoras) e Carol Santiago (S12, para atletas com baixa visão), a lançadora de dardo Raissa Rocha (F56, para cadeirantes), o velocista Petrúcio Ferreira (T47, para amputados de braço), o goleiro Luan Lacerda, o jogador de futebol de 5 Raimundo Nonato, os mesa-tenistas Danielle Rauen (classe 9) e Israel Stoh (classe 7) e os jogadores de bocha Evelyn de Oliveira (classe BC3) e Mateus Carvalho (classe BC3).

O Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) e a prefeitura de Hamamatsu celebraram a manutenção do contrato da sede da aclimatação brasileira para os Jogos de Tóquio. A 16ª edição dos Jogos Paralímpicos, que será sediada na capital japonesa em agosto de 2021, foi adiada por um ano devido à pandemia de Covid-19.

Com cerca de 790 mil habitantes, Hamamatsu fica localizada na província de Shizuoka, 260 km ao sul de Tóquio. A cidade abriga a maior colônia brasileira no Japão, o que motivou o município a se interessar em receber a delegação nacional.

A direção técnica do CPB esteve em Hamamatsu em 2019, quando visitou as instalações esportivas que servirão para os ajustes finais da delegação brasileira antes dos próximos Jogos Paralímpicos. Todas serão adequadas a fim de propiciar as melhores condições de acessibilidade e treinamento aos atletas do Brasil.

Fonte: Assessoria de Comunicação do Comitê Paralímpico Brasileiro

Postado por Antônio Brito 

12/03/2021

Nordeste fecha compra de 37 milhões de doses da vacina Sputnik

Os nove estados do Nordeste fecharam a compra de cerca de 37 milhões de doses da vacina Sputnik V, desenvolvida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia. O anúncio foi feito nesta sexta-feira (12) pelo governador da Bahia, Rui Costa, em vídeo postado nas redes sociais. Segundo o governador, a Bahia deve receber quase 10 milhões de doses do imunizante. 

"Conseguimos finalizar a compra de 37 milhões de doses, para os estados do Nordeste, da vacina Sputnik. Com isso, a Bahia ficará com quase 10 milhões de doses, para imunizar 5 milhões de baianos e baianas", afirmou.

A Sputnik V ainda não tem autorização de uso emergencial concedida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O governo federal também negocia a compra de mais 10 milhões de doses do imunizante russo.

Na capital baiana, o prefeito Bruno Reis também anunciou nesta sexta-feira a prorrogação das medidas de restrição de circulação de pessoas na cidade, para conter a disseminação da covid-19. As medidas, que ficarão em vigor pelo menos até o dia 22 deste mês, incluem a proibição de atividades não essenciais e o fechamento de praias, parques e clubes, além do toque de recolher, que vigora diariamente entre as 20h e as 5h.

Segundo o prefeito, as medidas já estão surtindo efeito, mas a pressão no sistema de saúde continua muito forte. Bruno Reis disse que, no setor privado, há 55 pacientes aguardando leito de unidade de terapia intensiva (UTI). Nos hospitais da rede pública, o número de pacientes na fila é de 76. 

"Só com isolamento social, reduzindo a taxa de contágio, é que a gente vai conseguir passar por esse momento crítico, o pior momento que Salvador está vivendo desde a chegada do coronavírus no Brasil", afirmou o prefeito em vídeo postado nas redes sociais.

Fonte  https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-03/nordeste-fecha-compra-de-37-milhoes-de-doses-da-vacina-sputnik

Postado por Antônio Brito 

Em Aracaju/SE, Biblioteca lança Projeto Pontes para Leitura

Foto: Maria Odília/Seduc

Buscando adaptar-se às necessidades ocasionadas pela pandemia da covid-19, a Biblioteca Pública Epiphanio Dória vem reestruturando suas ferramentas digitais e adotando medidas que visam a atender às necessidades dos seus usuários.

A Biblioteca realizou o lançamento do projeto Pontes Para Leitura, que consiste no empréstimo de livros e audiolivros do setor Braille nas residências dos usuários com deficiência visual que moram no município de Aracaju/SE. A ação, que vai acontecer semanalmente, funcionará via cadastro prévio, por agendamento e com todos os cuidados de higiene recomendados pelos órgãos de saúde.

De acordo com a diretora, Juciene Maria de Jesus, a Bped tem ciência de sua responsabilidade social e inclusiva no engajamento de uma sociedade mais justa e igualitária, e visando a atender a esse dever, foi elaborado o Projeto Pontes para Leitura. “É um projeto que tem por objetivo ir ao encontro da pessoa com deficiência visual na sua residência e ofertar-lhe o empréstimo de livros e audiolivros, com o intuito de minimizar o impacto causado pela pandemia e a dificuldade de locomoção do usuário, como meio de disponibilizar leitura acessível a todos os públicos e democratização e socialização do saber”, explicou.

A duração do empréstimo dos livros é de um mês, podendo ser renovado, e apenas dois títulos poderão ser disponibilizados ao usuário. O acervo disponível é formado por: CD em formato acessível MP3; livro com acessibilidade total; livro em fonte ampliada e Braille. O projeto tem como parceiros Associações e Instituições que trabalham com pessoas com deficiência visual, além da Fundação Dorina Nowill para Cegos e Instituto Benjamin Constant (IBC).

Segundo a responsável pelo Setor Braille da Bped, Anatércia Silva, o objetivo do projeto é desenvolver habilidades relacionadas à leitura e à escrita Braille. “Estimular a interpretação de texto, ampliando o conhecimento linguístico, cultural e social dos leitores, no intuito de realizar o empoderamento das pessoas com deficiência visual é o que esperamos com a realização do projeto”, afirmou.

Para fazer o cadastro é preciso ser uma pessoa com deficiência visual e residente no município de Aracaju. O cadastramento deve ser feito por meio do email anatercia.santos@seduc.se.gov.br ou pelo Instagram da Biblioteca @epiphaniodoria. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone: (79) 3179 1907.

Fonte: https://revistareacao.com.br/em-aracaju-se-biblioteca-lanca-projeto-pontes-para-leitura/

Postado por Antônio Brito 

Craques do goalball mostram que força vai muito além dos arremessos

Carol Duarte e Victória Amorim durante partida dos Jogos Parapan-Americanos de Lima 2019 | Foto: Daniel Zappe / EXEMPLUS / CPB

Ana Carolina Duarte Ruas Custódio, 33 anos, e Victória Amorim do Nascimento, 23, possuem muito mais afinidades do que terem nascido no mesmo estado do Rio de Janeiro e defenderem a Seleção Brasileira de goalball. Apesar dos dez anos de que separam duas das principais atletas da equipe, a vida de cada uma, de certa forma, traçou destinos semelhantes. Para o bem e para o mal.

Mas este texto não pretende focar nas tristezas, muito pelo contrário. Em data tão significativa, a ideia é que sirva de exemplo e leve tantas outras mulheres a se identificarem com as dores e os amores de pessoas reais, de carne e osso, cuja potência não aparece apenas nos arremessos em quadra. Pois foi justamente fora dela onde tiveram de ser mais fortes.

Bom, o primeiro traço que une a dupla é a precocidade de um fato que mudaria para sempre suas realidades. Ambas tinham 11 anos quando acordaram de cirurgias sem que pudessem mais enxergar como antes. A partir desse ponto, vamos separar as histórias para que você as conheça melhor.

Carol: novos passos da bailarina

Para quem nasceu em Madureira, um dos berços do samba carioca, dançar era quase uma redundância. Por isso, desde cedo, a música atraiu Ana Carolina às aulas de balé, jazz, sapateado e o que mais aparecesse em seu caminho. O sonho de ser bailarina, porém, foi encerrado quando fortes dores de cabeça levaram sua mãe, Ana Maria, a buscar ajuda médica. "Os médicos tratavam como sinusite", conta Carol.

O resultado de uma tomografia, no entanto, mostrou que a sinusite era, na verdade, um tumor do tamanho de um caroço de abacate na cabeça da jovem. Apesar de benigno, ele precisou ser extraído. No dia 21 de maio de 1999, Carol enfrentou 14 horas de uma cirurgia muito delicada: "Os médicos chamaram meus pais e disseram que eu tinha chance mínima de vida e, caso sobrevivesse, ficaria com sequelas muito graves. Quando acordei da cirurgia, não tinha ninguém perto de mim. Estava bastante grogue e não percebi que havia perdido a visão".

Os primeiros passos sem enxergar foram cada vez mais agarrados à saia da mãe. A jovem bailarina se tornou uma pessoa retraída, com medo de tudo. "Sempre fui manhosa, mimada pela minha mãe. Depois que perdi a visão, ela era os meus olhos, um pedaço de mim."

As aulas de balé, ela ainda tentou frequentar para estar próxima das amigas. Desistiu. Uma outra semente começara a ser plantada no Instituto Benjamim Constant, referência no país na área da deficiência visual. "Quando conheci o esporte, não sei se preencheu a lacuna da dança, mas me fez gostar de outra modalidade, que foi o goalball. Passei pela natação, pelo remo, mas foi no goalball onde me encontrei como atleta", relata.

Saudade E Fibra Para Se Reconstruir

No fim de 2002, Carol perdeu seu maior alicerce. Um mal súbito no coração logo após a família se reunir para montar a árvore de Natal levou Ana Maria para longe da filha de 15 anos. "Ali, eu percebi que tinha perdido meu anjo da guarda", diz a atleta.

O vazio, ela teve de preencher com a própria necessidade de se reerguer. Para isso, o esporte se tornou elemento fundamental. Dois anos após a morte da mãe, veio a convocação para defender o Brasil nos Jogos de Atenas, em 2004 – a primeira participação do goalball brasileiro em Paralimpíadas, motivo de orgulho até hoje: "Foi o goalball feminino que alavancou o Brasil no cenário internacional", ressalta.

O papel de líder – é a mais experiente da Seleção –, por sinal, ajudou a moldar sua consciência em relação ao que datas como a de hoje simbolizam: "Dizem que a mulher é o sexo mais frágil. Será? Com tantas atribuições, será mesmo que somos o sexo mais frágil? Penso que não. Pra mim, ser mulher é poder me superar cada dia mais e ser capaz de ter orgulho do que sou. Ser mulher e cega é uma luta constante contra os estereótipos que a sociedade nos impõe", define a jogadora. "Ser mulher também é receber críticas, ser rejeitada ou menosprezada apenas pelo meu gênero. Tudo isso só me faz querer ser mais forte e encorajada para dizer, com honra, que eu sou mulher, atleta e tenho deficiência visual!".
 
Victoria: mãe e atleta antes dos 20
Como ela mesma diz, foi "premiada". A Síndrome de Miller Fisher, doença que provocou a atrofia do seu nervo óptico e, consequentemente, a perda da visão ainda criança, afeta anualmente uma em um milhão de pessoas. Em Itaguaí, município a cerca de 70 km da capital do Rio, a pequena que já havia sonhado em ser de empregada doméstica, pois se orgulhava da tia que trabalhava em várias casas, a veterinária, dado o amor pelos bichos, demorou a entender que o quadro era irreversível.

"Achava que, se passassem dez, 15 dias, eu voltaria a enxergar. E foram se passando dois, três meses, e nada. Quando deu seis meses, tive de retornar ao hospital. Foi quando ouvi uma conversa da minha mãe com uma outra mãe falando que o médico havia dito que eu jamais voltaria a enxergar. Ali, sim, foi um baque", relembra.

Para se adaptar, acabou indo estudar no Benjamin Constant. Foi lá onde Victoria conheceu o goalball, em 2010. Porém, não se engane. O amor pela bola azul demorou a engatar. "De cara, não gostei. Você acha que eu ia ficar me arrastando pelo chão e levando bolada? Mas continuei, tinha minhas amigas. Dei outra chance em 2011", conta.

O que passou a mexer com a cabeça da jovem de 14 anos foi a velocidade com a qual a modalidade transformava sua vida. Aos poucos, ela entendeu que os gols marcados em profusão poderiam virar também seu sustento. "De uma menina que não tinha tênis para jogar e dependia de doação, eu comecei a comprar meus próprios tênis. Isso foi uma grande conquista. E acabou mudando minha vida de uma forma surreal, em todos os aspectos. Foi um gatilho muito importante para superar a perda da visão e me tornar a mulher que sou hoje."

Mas é claro que nada viria tão fácil. Como tudo em sua vida, outro acontecimento precoce abalou as estruturas. 

Menino Ou Menina?

Nos Jogos Paralímpicos do Rio, em 2016, Victoria já era uma estrela em ascensão na Seleção Brasileira. Porém, a derrota por 3 a 2 para os EUA na disputa pelo bronze no quintal de sua casa mexeu demais com o emocional: "Estava sofrendo muito com a depressão e não admitia nem deixava que falassem nada. Após a derrota no Rio, eu me cobrei demais, achei que tinha responsabilidade e fiquei muito mal. Quando pensei em engravidar, foi para suprir uma dor que era muito grande. Achei que, tendo um filho, voltaria a ser feliz outra vez".

Entre a teoria e a prática, no entanto, há uma distância que a própria Vic desconhecia. Quando soube da gravidez, aos 19 anos, levou um choque. "Como eu cuidaria de uma criança? Não sabia nem cuidar de mim mesma", conta. Com o pequeno Victor – que completa 3 anos no fim deste mês – nos braços, ela logo percebeu que a maternidade e a carreira como atleta precisariam entrar num acordo, afinal, uma coisa dependia da outra.

"Durante a gravidez e mesmo no pós-parto, eu pensei em desistir várias vezes. Até hoje penso, porque quero acompanhar o crescimento do meu filho, estar com ele o tempo todo. Mas não é possível. Dependo do esporte financeiramente para cuidar dele. Quando voltei para a Seleção, estava animada, mas, ao mesmo tempo, dilacerada por dentro por saber que eu deixaria meu filho com menos de seis meses de idade para poder jogar", diz, sobre o retorno à equipe, em 2018.

Hoje, ela concilia a dupla jornada com a ajuda da família, que se mudou do Rio para Suzano, sede do Sesi-SP, clube defendido pela ala de 23 anos. E espera que datas como a deste 8 de março esclareçam melhor o papel da mulher na sociedade: "O mais difícil em ser mulher e deficiente visual é a aceitação das pessoas, é elas te verem realmente como uma mulher, como uma mãe que pode fazer as coisas. O meu recado, então, é esse: que a gente pode, sim, que a gente consegue, sim!". Alguém duvida?

*Com informações da Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais (CBDV)

Assessoria de Comunicação do Comitê Paralímpico Brasileiro (imp@cpb.org.br)

Fonte  https://www.cpb.org.br/noticia/detalhe/3232/craques-do-goalball-mostram-que-forca-vai-muito-alem-dos-arremessos

Postado por Antônio Brito 

Raquel Banha: “As pessoas não têm de ignorar a deficiência”

Raquel Banha tem 24 anos e considera-se uma “Artivista”. Mulher de vários talentos, domina a arte da escrita no seu blog Chairleader e é mestre em Marketing Digital. Nasceu com uma doença neuromuscular rara e usa o blog para quebrar tabus e falar sobre a deficiência

Foto – Inês Oliveira

 

Li no teu blog, a certa altura, que “há 20 anos que namoras a tua varanda solarenga, local da casa onde te sentes mais viva e livre, e onde aprendes a viver através dos outros, das pessoas, dos animais, das plantas”. O que seria necessário para poderes sair da varanda e viver essa vida que tanto observas?

Há muitos factores, na verdade. Moro num prédio com 24 degraus, que não tem rampa, não tem elevador, não tem nada. E durante 18 anos, o meu pai, todos os dias, me transportava às cavalitas. Além de eu estar, obviamente, dependente dele, 56 anos já começam a pesar no corpo de um adulto. Então apareceu a Ana.

A Ana é a tua assistente pessoal.

Sim, comecei a ter assistência pessoal desde Outubro de 2019 e já desde essa altura que houve a necessidade de arranjar maneira de sair de casa, de forma, mais ou menos, autónoma. E em Maio de 2020, instalámos uma cadeira elevatória. Ainda não é ideal, por várias razões: esta cadeira de rodas (eléctrica) não vai a casa por exemplo.

Quanto é que pesa?

200 quilos.

Há ajudas do Estado para tudo isso?

Há algumas…esta cadeira foi o Estado que me deu, mas demorou três anos a chegar. É uma eternidade (sorri). Como estávamos numa situação complicada e urgente, pois o meu pai já estava mesmo muito mal das costas, tivemos de arranjar rapidamente a cadeira elevatória, e então fomos nós, do nosso bolso, que a pagamos. Agora estamos à espera da junta de freguesia. Disseram que como os degraus para entrar no prédio ainda estão na rua, poderiam fazer a obra sem cobrar nada. Portanto, para sair de casa, esta era a minha primeira barreira, a barreira arquitectónica, que é a mais óbvia. Depois há uma outra barreira, a barreira emocional. Eu agora, felizmente, com a Ana, supostamente já poderei fazer aquilo que quero. Mas estamos a falar de 23 anos. Foram 23 anos sem a oportunidade de fazer aquilo que eu queria, à minha maneira, no meu horário… E a nossa mente acaba por se moldar a essa realidade. E agora, tenho a oportunidade de sair, mas não sei o que é que vou fazer, não sei o que é que posso fazer, nem tão pouco tive oportunidade para construir um circulo social de amigos consistente para dizer “agora vou tomar um café com…” Não criei isso ao longo do meu desenvolvimento. E claro, tenho a consciência de que a minha personalidade também não ajuda. Às vezes acabo por ficar em casa, pois vou lá fora fazer o quê? Não sei. Há muita coisa que não conheço, não sei por onde começar… e isto depois é uma bola de neve. Costumo dizer que a independência é um músculo. E, no meu caso, foram 23 anos que estive sem utilizar esse músculo. É um processo lento e demorado.

E há o problema com que se deparam todas as pessoas que têm de se deslocar em cadeira de rodas eléctrica, que é a impossibilidade de entrar na maioria dos locais públicos, porque não têm acesso.

Pois, não entro.

Portanto aquela coisa de telefonar a alguém a dizer “vamos jantar não sei onde e depois vamos a uma discoteca” ou uma combinação de última hora, é uma coisa que não existe para ti. Tens de ter tudo programado, saber onde é que podes entrar e onde é que não podes entrar.

Lá está. É aí que entra o lado emocional. O trabalho de sair e planear tudo, com a grande possibilidade de chegar aos sítios e as coisas não correrem bem. Isso desmotiva-me imenso. Por isso é que digo que o lado emocional comanda tudo.

Compreendo.

Há aqui um degrau sim, mas o lado emocional é aquele que dita que vamos ter de arranjar uma solução, uma alternativa. E de facto a nossa vida tem de ser programada com muito tempo de antecedência. Tenho de telefonar primeiro, para saber se o sítio é acessível, depois as pessoas dizem-me que “ah, é acessível, sim”, chegas lá e não é acessível. Porquê? Porque as pessoas também não têm formação técnica para saber avaliar se aquele espaço é totalmente acessível ou não. Mesmo com a Ana ao meu lado é muito cansativo para mim…

Há um termo, que começa a ser usado quando se fala de discriminação e preconceito social contra pessoas com capacidades reduzidas – que é o “capacitismo”. Queres falar um pouco sobre isto? E já agora, gostava imenso que desenvolvesses a tua ideia de que (para ti) está ligado a uma “premissa de que assim que uma pessoa nasce e/ou fica com uma incapacidade é automaticamente um ser especial.”

Acho que é uma tendência natural da sociedade. Quando vês alguém diferente, começa a surgir uma variedade de suposições à volta dessa pessoa e nós baralhamos muito os termos “diferente” com “especial”. E não tem nada a ver uma coisa com a outra. Diferente é diferente… Ser especial é quando alguém faz alguma coisa que realça e tem valor. Estando agora mais dentro da comunidade de pessoas com deficiência, é algo que eu noto muito. Todos nós, a certa altura da nossa vida, somos chamados de “especiais e únicos”. Depois, quando chegamos ao mundo real e temos este contacto com pares da nossa comunidade, percebemos que afinal há mais pessoas como nós, percebemos que afinal não somos assim tão especiais, nem únicos. E isso tem várias consequências a nível psicológico e emocional. Por exemplo, pessoalmente, acho que isto mexeu muito, e mexe, com a minha autoconfiança. Quando faço alguma coisa e as pessoas me elogiam, fico sempre na dúvida se é puro mérito meu, ou se está ligado com esta conotação “especial da deficiência”. Ou seja, o facto de eu me ter apercebido desde cedo que não era assim tão especial, não era assim tão única, criou uma necessidade dentro de mim de criar essa “parte especial de mim” de que tanto falavam. E então há aqui uma espécie de exigência comigo mesma, “tenho de fazer alguma coisa para ultrapassar a minha deficiência”. Mas eu pergunto: será que isso é mesmo necessário? Será que isto é algo meu, ou é uma necessidade que desenvolvi por causa de tudo isto à minha volta? Não sei.

Também dizes que sentes com frequência as pessoas estarem contigo e isso fazê-las sentirem-se bem porque estão perante alguém que está pior do que elas. Perverso, não?

É perverso mas toda a gente pensa assim, eu inclusive. Aliás, ainda não consegui formular uma opinião sobre o voluntariado internacional, por exemplo. Agora está muito na moda, um jovem ir a África ou à Ásia fazer voluntariado durante umas semanas ou meses. Mas na maioria dos testemunhos que tenho lido, as pessoas vão com o objectivo principal de verem que há pessoas em situações piores do que elas. Vão lá, são iluminados pela desgraça dos outros e voltam seres superiores, com um currículo todo pimpão. E isso faz-me comichão. Mas lá está, não quero ser demasiado fundamentalista, porque ainda estou a tentar perceber este fenómeno e essa necessidade das pessoas se compararem a outras, para pensar “ah, afinal eu tenho que dar mais valor à minha vida”. Mas, até agora, com a informação que tenho, isso incomoda-me.

Naturalmente.

Incomoda-me, irrita-me. Nós não devemos comparar a nossa realidade com a dos outros.

Sim, a dor dos outros não pode ser um bálsamo para nós…

Não é? Irrita-me muito.

É a isso que tu chamas “objectificação da deficiência como meio de inspiração”?

Sim, mistura-se um bocado com o ponto anterior. “Eu gosto e sinto-me bem em ver alguém em “piores” condições que eu. Faz-me sentir melhor”… E há aquela cena do “ah eu vejo alguém com deficiência a fazer determinada coisa, se ela consegue, eu também consigo”.

Mas também há pessoas que fingem ignorar. 

Conheço várias pessoas, das quais tive necessidade de me afastar um pouco, porque elas vinham sempre com esse discurso do “ah, eu quando olho para ti, não vejo a deficiência”… as pessoas claramente deparam-se com uma pessoa diferente, com alguma coisa que não conhecem ou entendem, e a maneira delas lidarem com isso, ou tentarem disfarçar esse sentimento de estranheza, é dizerem “ah, eu olho para ti e não vejo a deficiência”. As pessoas não têm de ignorar a deficiência. É como eu estar a olhar agora para ti e ignorar que tens uma coisa nos ouvidos (os auscultadores do gravador). É ridículo. Não é real…. não faz sentido.

Como o que te aconteceu na escola, numa aula de ciências.

Exactamente isso… acho que foi numa aula de ciências, sim, em que o laboratório era no primeiro andar. A escola não tinha elevador, rampa, nada. E marcaram a aula lá para cima e eu fiquei muito chateada porque, quando eu vou para uma escola, a primeira coisa que se faz é falar com o conselho, com a direcção, para mostrar que eu tenho uma deficiência e que não é para esquecê-la, é precisamente para tê-la em conta. E marcaram aulas para o primeiro andar. Eu falei com uma professora e ela, com um ar muito despreocupado, diz-me para eu não ficar chateada porque isso queria dizer que olhavam para mim e não viam a minha cadeira de rodas. E isso não é um argumento válido. É só parvo.

Fazes parte da direcção do Centro de Vida Independente cujo objectivo é a defesa e a divulgação da filosofia da vida independente em Portugal. Queres falar-nos sobre o vosso trabalho?

A filosofia da vida independente vem revolucionar a maneira como se lida com a deficiência, pois há vários modelos da deficiência e o mais comum é o modelo médico. Que pressupõe que estas pessoas “têm de ser curadas”, e até haver uma cura, não há nada a fazer. As pessoas são postas num hospital ou num lar, à espera que aconteça algo, que não vai acontecer. Pronto. E a esperança destas pessoas está apenas ligada à ciência e aos laboratórios. Quando, na realidade, os processos de descoberta e de evolução científica demoram, às vezes, mais do que uma geração. Ou várias gerações. E não podemos deixar morrer gerações, à espera de algo que pode ou não acontecer. Então, houve a necessidade de se criar o modelo social, que diz que somos todos diversos funcionalmente e que as sociedades é que não estão adaptadas para toda a gente. Nascemos ou adquirimos esta ou aquela doença, e vamos provavelmente, morrer assim. Mas queremos viver a melhor vida possível com a nossa realidade, no presente. Sabemos perfeitamente que vamos sempre precisar de uma segunda pessoa para concretizar aquilo que queremos. Isto da vida independente não é nada mais, nada menos, do que fazermos aquilo que nós quisermos, tendo controlo total da nossa vida, das nossas opções. Com a ajuda de uma segunda pessoa.

No teu caso a Ana, a tua perna metade, como lhe chamas?

A minha perna metade (sorri) é como ter uma muleta, estás a ver? A muleta está lá disponível para eu poder fazer aquilo que eu quiser. A vida independente já é uma realidade nalguns países na Europa. Nomeadamente na Suécia, onde estão super avançados, e onde ter um assistente pessoal é super banal. Em Portugal, até há muito pouco tempo, nunca se tinha falado na hipótese de sermos nós a controlar a nossa vida. Há uma frase emblemática neste movimento que é “Nada sobre nós, sem nós”. É muito isso: é trazermo-nos como parte activa deste processo todo. Uma coisa que é muito comum ainda nas associações e instituições de pessoas com deficiência, é que a maioria delas são geridas por familiares, por cuidadores e por pessoas que não têm deficiência. E temos de alterar isso, porque são essas pessoas que estão a decidir e a lutar por coisas que nós podemos lutar. Temos uma voz e queremos muito ser activos e fazer acontecer, e não ir por aquele lado da solidariedade, de pedinchar, entendes?

Entendo, claro. É um direito que nos assiste enquanto seres humanos.

Tem a ver com direitos humanos, é isso mesmo. Os direitos humanos não são solidariedade. Está na constituição, está na lei. E nós trabalhamos para garantir que estes direitos humanos são cumpridos. Acho que é essa a nossa principal função, para que mais pessoas tenham estes direitos. Porque, por exemplo, em Lisboa, neste momento, somos apenas, salvo erro, menos de 50 pessoas a usufruir de assistência pessoal, paga pelo Estado. E isso é muito pouco.

Um tema que é particularmente sensível e que continua um tabu para as pessoas em geral é o amor, a paixão, a sexualidade. Muitas pessoas com diversidade funcional encontram-se dependentes da ajuda de outras para exercer a sua sexualidade. Em Espanha sei que há assistentes sexuais, mas não sei se esse serviço existe em Portugal, creio que ainda não.

Oficialmente não.

Queres falar um pouco sobre isso?

Olha, ainda no outro dia falei disso, ou ouvi falar disso, que tem a ver com o papel do assistente sexual. Qual é o papel do assistente sexual? Isso também é um tabu. As pessoas pensam que um assistente sexual é quase como um prostituto ou uma prostituta e não tem nada a ver uma coisa com a outra. Portanto, na sua génese não há sexo entre a pessoa com deficiência e o assistente. O objectivo do assistente é…por exemplo, uma pessoa com muito pouca mobilidade e que tenha muita dificuldade em ter prazer sexual com ela própria – masturbação, o ou a assistente sexual ajuda nesse processo, mas é a mão da pessoa com deficiência que faz essa exploração, com a força da mão do/da assistente. Não é uma mão qualquer em cima do teu corpo, é a tua própria mão, onde tu quiseres, como tu quiseres, mas com o auxílio de uma segunda pessoa. Depois ainda há outro tipo de assistência, necessária numa relação sexual, onde já estão envolvidas duas ou mais pessoas. Imagina que uma dessas pessoas tem dificuldade em fazer o movimento necessário para a relação acontecer – o assistente sexual poderá auxiliar nisso. Poderá estar na relação, mas nunca activamente. Portanto, está lá, mas apenas para auxiliar na realização da mesma. Outra situação, por exemplo, é uma relação sexual entre duas pessoas com deficiência.

Sim, sim. Eu conheço um casal assim. Têm dois assistentes, um para cada um deles.

Lá está. Têm? A sério?

Sim, vêm de Espanha, precisamente.

Fantástico. Que bom para eles. E depois há aqui uma outra situação, que ainda não está muito bem delimitada. Por exemplo, a Ana não é assistente sexual, é pessoal, mas até que ponto eu não poderia pedir à Ana que me ajudasse a pôr uma lingerie mais sensual? Ou, imaginando que eu não preciso de ajuda para o acto em si, mas preciso ajuda para me limpar. É um assistente pessoal ou é um assistente sexual? Ainda há coisas não estão muito bem definidas. Porque no fundo as tarefas que eu mencionei já não fazem parte do acto em si, são coisas extras ou posteriores.

Mas é importante que se criem condições em Portugal para formar esses assistentes. A sexualidade é um direito.

Aos 17 anos fui a uma conferência sobre sexualidade na deficiência e foram mencionados vários exemplos de progenitores que masturbavam os filhos. Isto é uma coisa completamente impensável! Por vários motivos lógicos, emocionais, de privacidade e dignidade humana. E isto acontece em Portugal, mais no interior, onde os pais acabam por dar este prazer sexual aos filhos… É algo sobre o qual o Estado devia ser responsabilizado. A sexualidade é um direito humano, logo o Estado tem de dar resposta a este tipo de casos. Obviamente no que toca a encontrar um parceiro sexual, estamos, teoricamente, muito teoricamente, em pé de igualdade. Visto que todos nós passamos por isso.

Quando falamos em sexualidade, falamos também da relação com o nosso corpo e é uma coisa por que toda a gente passa. Toda a gente tem de encarar isto como uma realidade. Faz parte da nossa vida, de todos nós.

Mas eu estou confiante que mais dia menos dia também haverá assistentes sexuais em Portugal.

Para terminar esta conversa, gostava que desenvolvesses a ideia que deixaste expressa no teu blogue e que diz: “Quero viver num mundo onde todos os Dom Quixotes têm lugar seguro para viver as suas aventuras de cavalaria e enfrentar todos os seus monstros e gigantes.”

Dou muito valor à saúde mental, para mim é das coisas mais importantes na vida. Porque…ok, eu tenho uma deficiência, é o que é, não há volta a dar, nem há muito mais para explorar, digamos assim. Mas existem todos os desafios que passam por “viver com a deficiência” e “viver num mundo que ainda não está preparado para viver com a deficiência”. E além disso, como é que eu hei de explicar… venho de uma família toda ela bastante emocional, digamos assim…e também há historial de doenças psicológicas na minha família – eu própria tenho depressão crónica há cerca de 15 anos – tenho ansiedade, sou obsessiva e compulsiva, mas para mim tudo isto é muito natural. Sou uma pessoa que fala abertamente sobre tudo. Essa frase que eu escrevi vem da minha necessidade de querer falar sobre isto tudo, sem ter vergonha, sem ter medo. E por um lado também gostava de ser compreendida, sabes? Porque, na verdade, quantos de nós não enfrentamos demónios e monstros? Todos nós temos desafios ao longo da nossa vida e é super natural a nossa mente levar-nos a sítios estranhos. E eu sinto muito essa necessidade de falar com as pessoas e tocar em assuntos mais “chatos”. E as pessoas não gostam de falar de problemas, nem sempre gostam de pôr a cabeça a funcionar e eu não sou assim. Eu gosto de falar sobre as coisas, gosto de tocar nas feridas e tenho um humor, muito negro e sarcástico, “eu vou falar sobre aquilo que tu não queres falar”. Gostava de sentir mais abertura por parte das pessoas para poder falar e dialogar sobre isso, sobre monstros e gigantes. Eu acho que é muito por aí. Pelo menos eu espero contribuir com aquilo que eu faço na vida e com o meu blog.

Fonte  https://hojemacau.com.mo/2021/03/11/raquel-banha-as-pessoas-nao-tem-de-ignorar-a-deficiencia/

Postado por Antônio Brito